Após o surto da Imperatriz, Liv foi afastada das funções por dois dias e, quando voltou para a sua sala e sua poltrona de couro, um novo paciente já lhe aguardava, inerte a qualquer coisa que não fosse o quadro na parede.
— A guerra? — Perguntou Liv, jogando sua bolsa no chão e pegando a prancheta de acrílico, sentando-se na poltrona logo em seguida.
— Como sabe?
— A Imperatriz me contou. Ela também falou um pouco de você, Diablair.
— Falou...?
— Falou. Não precisa se preocupar, ela não me contou nada muito revelador.
Diablair pareceu se perder ainda mais no quadro a sua frente. Liv aproveitou o momento de silêncio para fazer algumas anotações sobre o quadro e o efeito que ele, aparentemente, causava na família Infernal, a família mais insana e mortal daquele manicômio.
— Desculpa, mas nós precisamos começar.
Estava sendo extremamente cuidadosa com as palavras. Queria ser educada, a fim de conseguir extrair muito mais informações sobre o suposto líder das Hordas Infernais e toda a sua distorcida família assassina. Estudou muito os seus pacientes e sabia que Diablair gostava de tratar e ser tratado com muito respeito e formalidade.
— Tudo bem. Pode fazer as perguntas que quiser.
— Gostaria de começar perguntando com quem estou falando.
— Comigo, é claro. — Diablair parou por um segundo, absorvendo o real sentido da pergunta. — Se ele estivesse aqui, você certamente nem perceberia a sua morte.
Liv sabia sobre o True Diablair desde o período de estágio. Escolheu aquela instituição durante o mestrado apenas por causa da família infernal. Não podia negar que gostaria muito de falar com o True, mas agradeceu aos céus por ser apenas o Diab naquele dia, já que o caos causado pela Imperatriz fez os superiores ficarem de olho nela.
— Então você é o Tio Diab. Posso te chamar assim?
— Você não se parece com nenhuma das minhas sobrinhas, então me chame apenas de Diab, ok?
— Tudo bem.
Diablair mostrou-se extremamente desconfortável com o assunto de sua outra face, então Liv preferiu evitar que seu paciente lhe desse motivos para se ausentar do trabalho novamente. Decidiu que seria prudente evitar o True e focar apenas na história do Tio Diab.
— Pode me contar um pouco mais sobre você, Diab?
— Eu sou o Líder das Hordas Infernais, todos temem ao ouvir meu nome. Acredito que sou a criatura mais poderosa, depois da Deusa. Minhas sobrinhas têm potencial, mas ainda são muito jovens.
— Sua relação com a Deusa parece ser muito forte.
— Ela é uma amiga de longa data, que me escolheu para ser padrinho da Ternura. Foi o maior presente que já recebi em toda a minha maldita existência.
Antes de mencionar a Ternura, Diablair parecia totalmente desinteressado com a situação, respondendo apenas de forma automática. Liv anotou o fato, enfatizando que as próximas conversas com o Diab deveriam se iniciar falando da sobrinha mais nova.
— Já que estamos no assunto, quantas sobrinhas você tem?
— Quatro. A Imperatriz foi a primeira. Nossa relação foi um pouco conturbada, mas ela acabou me ensinando a fazer parte de uma família.
— Ela gosta muito de você.
— Tenho um enorme carinho por aquela que sempre me coloca nas piores situações imagináveis.
Diablair pareceu se perder em pensamentos por alguns instantes, possibilitando que Liv fizesse mais anotações a respeito da interação do Diablair com a sobrinha mais velha. Ela acreditava que o comportamento violento demonstrado pela Imperatriz poderia ser por conta da influência do líder Infernal, mas preferiu não compartilhar suas teorias, ao menos por hora.
— E as outras? — O puxou de volta para a conversa.
— A Trindade. Ternura, Tortura e Tristeza. Duas delas já causaram a minha morte.
— Poderia me explicar mais?
— A caubói infante, conhecida como Ternura, arrumou um namorado antes mesmo de aprender a falar direito. Aquele foi o meu infarto mais doloroso. Tortura veio ao mundo nos braços daquele Hunter desgraçado, apenas isso basta para matar um tio.
— Pelo que estou vendo, você é super protetor. A Tristeza não te causou problemas?
— Eu apenas sou cauteloso e prefiro manter as minhas sobrinhas longe dos pecados da carne, elas são muito jovens. Por hora, Tristeza é a única que não me causou nenhum infarto.
Diablair agitou-se ao pensar que enquanto estava ali, respondendo perguntas inúteis, suas sobrinhas poderiam estar correndo perigo. Ternura poderia inventar um rodeio perigoso, a Tortura poderia fugir da mansão com a Imperatriz e a Tristeza poderia fazer chover ácido.
Liv percebeu que algo estava errado com seu paciente. Ele estava muito inquieto, sempre mudando de posição na poltrona e evitando olhar diretamente para ela. Aquilo ativou seu sentido de perigo e ela tentou reverter a situação sem causar danos.
— Impressão minha ou você está um pouco melancólico, Diab?
Diablair pareceu voltar aos sentidos quando ouviu a voz da psiquiatra. Ele respirou fundo, arrumou a roupa azulada e endireitou as costas na poltrona.
— Desculpe. Estamos travando batalhas o tempo inteiro, estou um pouco preocupado com as minhas sobrinhas sozinhas em casa. Se possível, gostaria de voltar para a mansão Infernal agora.
— Claro, tudo bem.
Liv chamou Rainar e Brian para acompanharem Diablair de volta ao quarto que ele chamava de mansão, e afundou-se nos dados novos que havia conseguido coletar durante aquele breve período de tempo em que se esteve frente a frente com o Líder das Hordas Infernais.