Henrique, um antigo trabalhador de uma empresa de construção, atualmente desempregado, Laura uma compositora, pianista, presentemente sem um trabalho rentável, e João, o ex-boxeador, estes foram os selecionados para o experimento, Padrões Mentais. Já olhei suas fichas, logo eles devem chegar para assinar os seus contratos. Finalmente, minha pesquisa poderá entrar em fase de testes.
Começo minha apresentação sobre o experimento, sentados na mesa circular, os participantes me observam, intrigados.
— Bom Dia! Senhores e senhora, eu sou a doutora Alice, mestre em neurociência e encarregada deste experimento. Esta pesquisa visa observar o funcionamento do cérebro, enquanto estamos em estado de repouso. Seu objetivo é, discernir o efeito que o subconsciente tem sobre os sonhos, e como sua intromissão afeta o consciente. — Todos me encaram com uma expressão de dúvida. — De modo prático, vocês devem tomar a droga experimental Sub-C.V.4. Esta medicação permitirá uma observação do subconsciente, por meio da radiografia cerebral. Todos os dias úteis da semana, vocês deveram vir ao Corvus, para a administração do medicamento. Logo após tomá-lo devem se deitar no aparelho RM de campo fechado. O sono deve surgir gradualmente, o Sub-C.V.4 os deixará extremamente sonolentos. Saibam que esta rotina de trabalho deve ser seguida à risca, não iremos tolerar que se ausentem, se ficarem, mesmo que por pouco tempo, sem o medicamento, o experimento não irá produzir resultados aceitáveis. Não há motivos para preocupações, caso estejam sentindo algum efeito colateral, por favor os descreva com o máximo de exatidão possível em seu relatório semanal. Sim, além do experimento, também é requerido a escrita de um relatório. O mesmo, deve ser escrito nos fins de semana, eu pessoalmente irei os recolher no primeiro dia útil de trabalho. Nele deve ser informado sua experiência em seus sonhos, caso tiverem uma, juntamente com o efeito colateral, caso tiverem algum. Estes são os termos, os mesmos estão escritos, de forma mais detalhada, nos contratos à sua frente, assim como a compensação que receberão, no caso o valor é de $1.800. Bem, este o resumo do seu contrato, alguém tem alguma pergunta? — Finalizo o meu resumo das funções que os participantes devem exercer. Percebo que eles ainda estão confusos, com certeza eles irão fazer muitas perguntas, afinal, é apenas natural que eles queiram saber o que iremos fazer com os seus corpos.
Surpreendentemente, eles não fazem perguntas. Rapidamente todos assinam seus contratos.
— É só da assinatura que vocês precisam para confirmar a nossa participação? — Pergunta Henrique.
— Sim! Vejo que todos concordaram com os termos. Bem, agradeço pela sua presença, espero vê-los amanhã. — Digo conforme os participantes se levantam. Lentamente, eles deixam o estabelecimento, se despedindo educadamente conforme saem.
Agora está tudo pronto. A equipe, assim como eu, está ansiosa pelo início do experimento. Faz anos que eu o viabilizo, em fim ele se tornará realidade. Finalmente, a humanidade poderá investigar o maior mistério deste mundo, à nossa mente.
Uma semana se passou, confesso que estou um pouco decepcionada com os resultados obtidos. Os relatórios não continham nenhuma informação relevante, e o funcionamento cerebral se manteve estável. Acredito que a Sub-C.V.4 age de forma mais lenta em cérebros humanos. Só o tempo dirá se a droga irá afetar o funcionamento do subconsciente, em seu estado atual, não é possível obter nenhuma conclusão sobre o cérebro. Tudo que posso fazer é esperar.
Já faz seis meses desde que o experimento se iniciou. Felizmente, os efeitos desejados foram se tornando mais evidentes conforme os meses se passaram. Aos poucos, a Sub-C.V.4 começou a cumprir o seu papel. É possível observar os padrões se modificarem à medida que os pacientes adentram mais profundamente em seus repousos, é visível a ativação de vários hemisférios que antes eram inutilizados pelo cérebro. Acredito que este conjunto distinto de hemisférios cerebrais seja o subconsciente, ou pelo menos, o caminho que leva a ele, a chave que abre a porta onde este mistério repousa. Em pouco tempo, terei uma resposta mais precisa sobre esta questão, felizmente, a atividade nos hemisférios cerebrais se torna cada vez mais intensa.
Se passou mais um mês, e os pacientes começaram a ter experiências relacionadas à consciência. Enquanto dormem, os mesmos têm sonhos exóticos. Estes sonhos, e as sensações que eles trazem, foram registradas, de forma detalhada, em seus relatórios semanais.
Henrique — Relatório N.H-28:
Vigésima oitava semana do experimento, padrões mentais.
Diferentemente das semanas anteriores, em que apenas dormia normalmente, nesta semana consegui perceber que estava sonhando. Era como se estivesse navegando pelos mares profundos da minha mente, procurando por algo, algo desconhecido. Esta é a melhor forma de descrever o que senti.
Já que é necessário relatar esta experiência detalhadamente, irei me esforçar para criar um relato que expresse este acontecimento com o máximo de exatidão possível.
Despertei em um local escuro, não, vazio, vazio como o espaço entre as estrelas. Tudo que fiz foi percorrer esta sombria vastidão, sentia que precisava encontrar algo, porém, não sei dizer o que buscava. Depois de vaguear pelo que se pareceram horas, vi uma luz no horizonte, brilhando intensamente em amarelo. Segui em direção ao desconhecido local, conforme me aproximava desta intensa fonte luminosa, aos poucos, eu começava a despertar. Sempre despertava antes que pudesse chegar ao meu destino.
Este foi o sonho que tive durante toda a semana anterior.
Laura — Relatório N.L-28:
Confesso que não esperava ser afetada por esta droga, entretanto, na semana passada algo ocorreu. Aqui estarei relatando a estranha experiência que tive.
Abri meus olhos, surpreendentemente, vi meu corpo deitado no aparelho de ressonância. Esta visão se dissipou rapidamente, em pouco tempo, eu estava diante do vasto universo. Sem perder tempo, comecei a vagar pelo desconhecido. Em minha viagem, vi os mais distantes planetas, explorei as mais imensas galáxias e as mais lindas nebulosas. Vaguei pela imensidão do espaço, observando o grandioso cosmos, tentando encontrar algo, não sei dizer o que procurava, só sei que era algo desconhecido, algo perdido nesta imensa vastidão. Percorri o cosmos por muito tempo, não faço ideia do tempo exato, só sei que aparentou ter sido anos, provavelmente, minha percepção do que seria o tempo estava alterada. Após minha longa peregrinação, vi uma linha amarela desenhando-se entre as estrelas. Seguindo meu instinto, fui atrás da linha, porém, antes que pudesse chegar ao local misterioso que ela me levaria, a consciência retornou ao meu corpo.
João — Relatório N.J-28:
O sonho não mudou muito, ele continua sendo basicamente o mesmo que tenho sempre que durmo, entretanto, a mínima mudança que ocorreu será descrita neste relatório.
Como sempre estou caindo, me afundando cada vez mais na escuridão. No vazio, caio sem rumo, sem direção, apenas existo em meio ao nada. Já não me incomodo, apenas aceito que este é meu destino, porém, aos poucos o vazio, outra hora imutável, vai ganhando cor. O preto se torna cada vez mais amarelo, o espaço vai se estreitando, sinto que estou sendo levado a algum lugar, não sei dizer que lugar, infelizmente, desperto pouco antes de chegar ao meu destino.
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Estes relatórios me intrigam, passei todo o domingo os estudando, mal tive tempo para dormir. Pelo que pude concluir, os pacientes, aparentemente, estão sendo guiados, acredito que por suas próprias mentes, para algum lugar, talvez o subconsciente? Creio que esta luz amarela seja o consciente os levando até a parte mais obscura de suas mentes. Dos três pacientes, o que se demonstra mais promissor é João, ele sofre com terrores noturnos desde que se aposentou, talvez ele já estivesse, por conta própria, se comunicando com seu subconsciente sem perceber. Sabendo que o Sub-C.V.4 se torna cada vez mais efetivo, acredito que logo descobriremos o que é este local misterioso, talvez na próxima semana?
Algo dá errado, os sinais vitais dos pacientes estão enfraquecendo. O que diabos está acontecendo? Talvez este seja algum efeito colateral? Não sei, não faço a mínima ideia do porque seus batimentos estão decaindo. Já o sacudimos, fizemos barulhos, agora, como último recurso, iremos administrar a Adrenalina para acordá-los. Para surpresa de todos a medicação não fez nada. Não sei mais o que fazer, já tentamos de tudo, nada funciona, é como se eles estivessem em um coma de alto grau. Eles não respondem a nada, devemos continuar tentando ou eles irão morrer.