Rosary Blue
Alien
Tipo: Conto ou Crônica
Postado: 13/10/16 14:08
Editado: 15/10/16 12:41
Avaliação: Não avaliado
Tempo de Leitura: 24min a 33min
Apreciadores: 9
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Este texto foi escrito para o concurso "Concurso de Halloween" No Concurso Oficial de Halloween da Academia de Contos, apoiado pela DarkSide Books, convidamos os participantes a escreverem textos no estilo "creepypasta", ou seja, obras detalhadas de terror escritas com o objetivo de assustar os leitores e deixá-los se perguntando o que é real e o que é ficção na história. Ver mais sobre o concurso!
Não recomendado para menores de catorze anos
Notas de Cabeçalho

"Olha, é um tema! Me solta, eu preciso fugir dele!"

Não gostei muito do meu texto. Mas como fiquei dias escrevendo ele para o concurso, resolvi postá-lo mesmo assim.

A história não é inspirada na música do The 69 Eyes, mas ela me ajudou muito.

Capítulo Único Rosary Blue

Tudo começou numa sexta-feira a tarde. Nós éramos quatro, curtindo a piscina da casa de João Lucas. Era para começarmos a fazer um trabalho de inglês, mas eu era a única com um caderno, esparramada em uma cadeira de praia. Tendo que olhar o João trocar beijos com Kauany a cada dois minutos. Não havia nada de mais repugnante para mim. O que ele via naquela loira magrela?!

-Você estuda demais!

Rodrigo veio até mim sorrindo e se sentou na cadeira ao meu lado. Aproveitando para roubar um golinho do meu suco, espiou meu caderno.

-Já teve alguma ideia?

-Não - suspirei. Nada.

Ele pegou o caderno e começou a ler as últimas páginas escritas. Rodrigo também não havia entrado na piscina, ficando sentado na borda o tempo todo, zoando com o casalzinho. Vestia apenas um calção escuro, deixando sua pele bronzeada a mostra. Era um rapaz bonito; não muito alto, atlético e com um denso cabelo castanho que sempre estava arrepiado. Tinha uma pinta escura perto do olho direito, também castanho. Sempre animado e gentil.

Franzi o cenho.

-Eu não consegui pensar em nada. Sei lá, parece que ou é muito... comum, ou é muito exagerado.

Falei mordendo o lábio, me sentindo idiota.

-Olha. Eu acho que antes da gente tentar fazer alguma coisa de Halloween, devíamos falar sobre. Tipo, casos macabros, abóboras ou algo assim.

Dei risada.

-Claro. Então meu gênio, comece falando.

Rodrigo resmungou e riu. Colando o dedo indicador nos lábios, ele olhou para as folhas das palmeiras acima da gente. Então deu um pulo da cadeira.

-Por que a gente não fala de algum caso macabro de Halloween?

-Eu não sei de nenhum, tu sabe?

-Bem... não é beeem de Halloween, mas...

Revirei os olhos.

-Tem que ser algo relacionado a data, Rô, a prof foi bem clara.

Ele estalou a língua e fez um gesto de pouco caso.

-Quer algo mais Halloween do que isso? A gente também pode mudar umas coisinhas e fingir que o texto é nosso...

-Tá, mas e se o pessoal conhecer a história?

-Hum... então a gente pode fazer um curta sobre. Tipo, eu sei de um caso que aconteceu aqui na cidade há muitos anos atrás, aí a gente podia ir lá filmar e contar o que o pessoal diz que aconteceu.

Eu podia dar pulinhos de alegria.

-E aí a gente fala sobre a origem do Halloween, o que significa e por que então que dá origem a tantas histórias macabras!

-Sim! Eu vou lá chamar aqueles dois.

João e Kauany estavam conversando baixinho no outro lado da piscina. Ele sorria maldoso e ela sussurava algo de volta para ele, mexendo incessantemente no cabelo escorrido. Mas quando Rodrigo chegou lá, algo interessante aconteceu.

Era como se de repente João não existisse mais para Kauany. A garota parara de mexer no cabelo e olhava Rodrigo fixamente com admiração, enquanto o ouvia explicar a ideia.

Ela e João logo sairam da piscina, ele vindo diretamente até onde eu estava sem nem se importar em estar só de sunga, secando-se com uma toalha. Kauany amarrava uma canga de estampa étnica na cintura, por cima de seu biquini preto. Parecia uma modelo, com seu corpo magérrimo e os olhos verdes. Possivelmente, estava até usando maquiagem a prova de água, se eu bem a conhecia.

João se esparramou na cadeira ao meu lado e, como Rodrigo, tomou o caderno da minha mão. Seu cabelo azul como seus olhos, estava úmido e sua pele toda vermelha. Aquilo provavelmente ia arder depois.

-Então Renata, vocês já decidiram?

Ele folheava meu caderno parecendo desinteressado. Desapontada com o comportamento dele, só assenti enquanto Rodrigo sentava ao meu lado e começava a explicar tudo.

-Nós conversamos e achamos que seria legal a gente fazer tipo um documentário, falando da origem do Halloween e contando uma história macabra que aconteceu lá perto da casa do meu avô. A gente pode ir lá amanhã, o meu irmão leva e busca se a gente pedir.

Acariciando as pernas de João que estavam sobre seu colo, Kauany sorriu.

-Eu acho que vai ficar bem legal - mas logo ela torceu o rosto -, só não sei se vou gostar muito da parte do...-

Rodrigo a interrompeu com uma gargalhada diabólica, e João falou em seguida.

-Ah, Kauanynha, eu te aconselho a levar umas fraldas junto, o Rodrigo já me falou disso, diz que até hoje tem mancha de sangue lá na cerca e as pessoas sempre veem vultos por lá.

A garota percebeu o deboche e deu um tapa na mão dele enquanto ele ria.

-Eu tô falando sério! Não se brinca com essas coisas! - Ela então buscou apoio em meu olhar - Renata...

Encarei meus pés.

-Olha gente...

-Olha nada! - João me interrompeu indignado - Vocês duas vão ir sim, deixem de ser cagonas. Não tem nada de mais, essa história já aconteceu faz muito tempo.

-E o que é essa história, afinal? - Kauany cruzou os braços e olhou para ele com raiva.

O garoto bufou e esfregou os olhos, irritado.

-Cortaram a cabeça dum cara e penduraram na cerca lá perto da casa do vô do Rodrigo, satisfeita?

Eu e Kauany nos olhamos horrorizadas.

-E você quer apresentar isso na aula de inglês?!

Me virei e perguntei para Rodrigo. Ele se mexeu encabulado.

-Achei que daria algo bem legal... é sangrento e tal. E o cara realmente morreu no final de outubro. Combina com o Halloween.

Bati com a mão na testa enquanto Kauany revirava os olhos.

-Gente, não é porque é Halloween que é só a gente é ir lá e falar uma atrocidade qualquer! - Ralhei.

A outra menina completou.

-E, eu acho que o dia das bruxas nem é isso.

João olhou pra ela incrédulo.

-Você não assiste filme de terror não?

-Ai, cresce, né João! Acredita em tudo que vê na TV agora?

-Acredito do mesmo jeito que você naquelas porcarias de revista de menina perua.

Foi a gota d'água.

Kauany levantou abruptamente, jogando as pernas de João no chão. Pegou uma blusa preta e solta da bolsa e a vestiu em segundos. Então fechou o zíper da sacola e a jogou sob os ombros, furiosa. O garoto não parecia entender nada.

-Se vocês querem saber, a perua já está quase atrasada pro cabeleireiro - e virando-se para mim, continuou - depois você me manda no Facebook o que vocês decidiram, Rê, porque mais um minuto com esse imbecil eu simplesmente não aguento. Tchau Rodrigo.

-Tchau... - o garoto balbuciou confuso.

Nós três ficamos nos encarando até ouvirmos o portão da frente bater com força.

-Vaca!

João socou a cadeira.

-Ah cara... tu também pediu pra levar... - Rodrigo balançou a cabeça em reprovação.

-Vai se foder. A gente vai fazer essa merda ou não?

Ele olhou pra mim. Suspirei resignada.

-Vamos fazer esse maldito documentário então.

Avisei Kauany no Facebook e combinamos de nos encontrar na casa de Rodrigo, oito horas da manhã no dia seguinte.

Todos nós ganhamos autorização para passarmos o fim de semana na fazenda. Minha mãe na verdade, só deixou porque conhecia a avó de Rodrigo, e os pais de Kauany fizeram questão de ligar para o casal e saber detalhes de tudo. João aparentemente já havia ido lá várias vezes com o amigo, então não teve problema algum com isso.

O irmão de Rodrigo dirigiu em alta velocidade por todo o trajeto de asfalto praticamente deserto. Victor havia conseguido sua habilitação provisória há pouco tempo e tinha ganhado dos pais um carro popular. Para nos levar a casa dos avós, no entanto, a mãe deles tinha deixado ele pegar o carro dela, moderno e importado. Não parecia ser o melhor veículo para se ir ao campo, mas eu já tinha visto o rapaz argumentar a favor de si próprio e ele era bom.

Calouro no curso de direito, eu não ficaria nada surpresa se ele viesse a se tornar um advogado de prestígio no futuro. Lábia para isso ele tinha.

-Que droga, Victor, vai devagar!

Rodrigo reclamou no banco da frente, quando o carro fez uma curva. Seu irmão apenas soltou um resmungo e aumentou o volume do som. Os dois eram praticamente idênticos de aparência - tirando a diferença de idade, quatro anos -, mas não podiam ser mais diferentes em todo o resto. Enquanto o mais velho era exibido e inconsequente, o que as meninas mais adoravam no Rô além de sua aparência, era o jeito simpático e de bom moço que ele tinha.

Era muito complicado não gostar de Rodrigo.

-A vó Violeta ainda faz aquele bolo?

João perguntou. Ele estava sentado no meu lado direito e Kauany no esquerdo. Os dois simplesmente não conseguiam nem olhar um para o outro.

-Faz. Eu aposto que ela vai ter bolo de chocolate pronto porque é o preferido do Victor - Rodrigo respondeu.

Kauany não perdeu a oportunidade de alfinetar João.

-Você veio pra fazer o trabalho, não pra comer.

E ele rebateu quase que instantaneamente.

-E você nem pra isso, de sandalinha no campo.

-Ai, calem a boca, vocês dois. Ou eu faço os dois descerem na próxima curva - Victor ralhou irritado.

-Do jeito que você dirige, é só a gente abrir a janela!

Kauany provocou e eu dei uma cotovelada nela. João a olhava com tanta raiva, que eu não sabia se era por ele também correr risco, ou se queria que ela continuasse a tagarelar para que Victor a deixasse na estrada. Ninguém duvidava de que ele realmente o fizesse. Rodrigo só me olhava pelo retrovisor como quem pedia desculpas. Os dois briguentos eram apenas amigos dele, não meus.

Levamos mais uns quinze minutos de trajeto silencioso e desconfortável. A música eletrônica e irritante de Victor, não ajudava em nada para acalentar nossos ânimos. Ou falta deles.

O mais velho tirou nossas mochilas do bagageiro e rumou de volta para o carro.

-Você não vai ir dar um Oi? - Rô perguntou para o irmão. Esse pareceu cansado.

-Dou um Oi amanhã. Diz que mandei um abraço, vou pra casa dormir que eu tô um trapo.

Óbvio. Sábado de manhã.

Nós seguimos até a grande casa e a dona Violeta nos recepcionou cheia de sorrisos e beijos no rosto. Era uma mulher gordinha e de cabelo curto e grisalho. Nos serviu bolo de chocolate (achando que o neto mais velho viria junto) e refrigerante na cozinha. Ela só não gostou muito quando Rodrigo deu uma explicada sobre o que a gente ia fazer.

-Ai, crianças! Falar disso no colégio? Que tipo de aula é essa?!

-Érr di Halloween vó - Rodrigo falou com a boca cheia.

-Halloween?

-Dia das bruxas, tia - João falou - aí a gente vai contar o caso que aconteceu aqui há muitos anos.

A senhora continuou sem gostar da nossa ideia. Mas ainda que relutante, só avisou de que havia muito mosquito no matagal por onde faríamos uma trilha para sairmos no velho vilarejo que dava para a propriedade abandonada em que iríamos.

Todos passamos repelentes e então saímos, levando apenas nossos celulares, a camera de João e garrafas de água. A ideia era falar com algum morador do vilarejo local que soubesse a história toda. Mas assim que pisamos dentro da floresta, Kauany perguntou a Rodrigo do que afinal era a história.

-Eu já disse, cortaram a cabeça do cara e penduraram na cerca.

Ela pareceu irritada.

-Isso eu sei né. Quero saber o porquê.

Rodrigo pensou um pouco, chutando um galho do meio da trilha.

-Falaram que o cara tinha uma dívida. Que ele se recusou a pagar e o mataram.

-Só? É um crime comum.

-Não, não é só isso - ele a olhou assombrado -, ninguém sabe quem matou o cara ou quem mandou matar. Tem uns que falam que ele devia para um agiota, mas tem outros que dizem que os que eram mais próximos dele, contavam que ele conseguiu tudo sozinho, apenas tendo sorte. Por isso alguns diziam que ele fez pacto com o diabo. Junto com a cabeça do cara era pra ter um rosário, que dizem que ele havia começado a usar na crença de se proteger.

Eu não achei nada engraçado, até porque Rodrigo estava contando a história claramente desconfortável. Mas ao meu lado, João começava a rir alto. Nós dois seguíamos atrás de Kau e Rô.

-Se o capeta - ele falava entre risos - morar aqui perto, você me leva pra trocar uma ideia com ele? - E então João gritou em tom de deboche - SATANÁS, VEM ME PEGAR SEU CAGÃO!

Dei um tapa no braço dele e a outra menina o olhou com ódio. Rodrigo nem se deu o trabalho de se virar para responder.

-Vai se ferrar. Te levo lá se ele prometer chupar teu sangue.

João riu mais ainda. Kauany se virou para Rô intrigada.

-Não são os vampiros que chupam sangue?

-Tanto faz, nada dessa merda existe mesmo.

Rodrigo parecia irritado agora. No meu lado, João Lucas me cutucava, provavelmente achando engraçado e indignante a falta de conhecimento dos dois. Mas Kauany, eu sabia, era tão inteligente quanto uma porta. E Rodrigo... só acreditava no que ele via. Para ele, tudo isso de diabo e vampiro eram apenas histórias que sequer o assustavam. Então não era coisa de seu interesse.

A mata era cheia de árvores, mas era aberta de modo que podíamos caminhar tranquilos pela trilha principal. O ar umido e o cheiro de terra molhada era uma das melhores coisas em um dia quente como aquele. Ainda mais porque, tirando Kau - que se importava em estar bem vestida antes de qualquer coisa -, todos usávamos calças jeans. Bem-te-vis cantavam alto no céu, mas nossos passos ressoavam alto na floresta deserta. Era até esquisito não encontrar nenhum animal.

Mais esquisito que isso, só o que meus olhos captaram a muitos metros de distância na minha direita.

-Gente, eu encontrei uma coisa!

Falei antes de correr na direção do objeto. Os três logo vieram atrás de mim para ver o que eu havia achado.

Senti um calafrio na nuca e meus colegas pareciam tão desconfortáveis quanto eu, quando recolhi o rosário azul da terra.

Era bonito e reluzente. Tanto, que mesmo amedrontada, Kau se inclinou para olhar mais de perto.

-É bem bonito. Digo, para os parâmetros religiosos de colares.

João revirou os olhos.

-Rosários não são artefatos de beleza, Kau.

-Eu sei né João. Mas não são da Dona Violeta, ela não perdeu aqui de repente?

Rodrigo franziu o cenho.

-Minha vó é evangélica.

-Deixa isso aí, Rê, alguém deve ter perdido aqui - João falou.

-Mas -resmunguei - eu gostei dele. E quem perdeu não vai voltar aqui para procurar.

-Renata, era um rosário que estava enrolado na cabeça do homem decapitado - Rodrigo começou -, é sério que você quer ficar com issso aí?!

Os outros dois não falaram nada, mas o silêncio deles não soava favorável a mim.

- Foi só uma coincidência.

E guardei o rosário no meu bolso. João acabou dando uma risadinha de canto e uma cotovelada em mim.

-Sua mórbida.

Voltamos a trilha e seguimos andando por mais uns dez minutos em silêncio. Foi quando eu comecei a notar que Rodrigo olhava para todos os lados.

-Que foi, Rô?

Perguntei a ele. Que suava, quando se virou para me responder.

-Eu não sei. Mas a gente já deveria ter chegado. Tem algo errado, a gente deve ter pego a trilha errada.

No meu lado, João parou e explodiu.

-Cara, tu que tá indo a frente e conhece essa merda!

-Eu sei! - Rô começou a puxar os próprios cabelos - Mas a gente tá caminhando há um tempão e parece que a mata não mudou nada já faz quase dez minutos!

Um silêncio desconfortável pairou entre nós. Foi quando João deu um pulo e enfiou a mão no meu traseiro.

-Que merda tu tá fazendo?! - Gritei e comecei a tentar empurrá-lo.

Foi quando ele conseguiu meter a mão no meu bolso. Pegou o rosário e se afastando, o segurou no ar.

-Isso! - ele balançou - Depois que você pegou essa merda que a gente se perdeu!

Sob nossos olhares assustados, João arremessou o rosário o mais longe que conseguiu.

Eu o empurrei.

-Por que você fez isso?! Idiota!

Corri até o rosário e o recolhi do chão. João Lucas veio atrás e tentou tirá-lo da minha mão.

-PARA!

Gritei. Ele imediatamente parou em si e pigarreou constrangido.

-Renata! Por favor, joga fora essa porcaria!

-Não! E não tente tirá-lo de mim!

Eu segurava o rosário contro o peito quando Rodrigo e Kauany vieram até nós correndo. A menina estava em pânico.

-Rê, olha, por favor, eu tenho um parecido lá em casa que eu não uso, eu te dou ele, mas faz o que o João falou!

A olhei com raiva.

-Eu quero esse, esse!

Deixei os três para trás e andei de volta para a trilha.

Comecei a seguir adiante, com raiva e achando que os três andavam assistindo muito filme de terror. Mas quando percebi que eles não vinham atrás de mim, parei.

- O QUE VOCÊ ESTÃO ESPE-...

O resto da minha frase simplesmente morreu no ar.

Não tinha mais ninguém onde eles estavam.

Girei o corpo e olhei toda a floresta ao meu redor. Sentindo o pânico correr pelas minhas veias.

Corri de volta na direção onde eu os tinha deixado. Não, não tinha como eles terem fugido tão rápido.

Gritei o mais alto que eu pude.

-RODRIIIGOOO! JOOOÃÃÃÕOO! KAAAUAANY! NÃO TEM GRAÇA! Não!

Choraminguei e chutei a terra frustrada. Não sabendo o que fazer.

Foi quando um barulho alto me fez dar um pulo. Era um solo de guitarra que dava arrepios. E que vinha de algum lugar do chão.

Visualizei a luz da tela de um celular jogado perto de uma árvore ao mesmo tempo que reconhecia a música que tocava dele. Era Paranoia da banda A Day To Remember. Aquele celular só poderia ser o do João.

Caminhei até ele e, tremendo, recolhi a aparelho do chão, quase o deixando cair de volta em seguida. Era uma chamada de um número sem identificação. Nervosa, nem pensei direito e atendi.

-A-alô?

Do outro lado da linha, só vinha um chiado. Repeti.

-Alô?

E então quem quer que fosse, desligou.

Aproveitei que estava com o celular de João e disquei o número de minha mãe, já que o aparelho dele tinha sinal e o meu não.

-O seu saldo é insuficiente para realizar essa ligação...

Bufei e desliguei, não acreditando. Eu tinha certeza de que o celular de João sequer era pré-pago. Tinha algo muito errado acontecendo. E sem conseguir pensar em alguma coisa coerente, tirei o rosário do bolso e o arremessei longe, começando a andar mais adiante para o lado em que eles poderiam ter ido. Fora da trilha.

Amedrontada, eu olhava para todas as direções, inclusive virando para trás a cada minuto. Eu quase que não repararia na mecha de cabelo jogada aos meus pés. Era um pequeno chumaço de cabelos azuis. Com uma mancha vermelha bem no meio. Um arrepio sinistro percorreu meu corpo.

Contrariada, me agachei e toquei o líquido. Sentindo meu dedo queimar como se fosse algo corrosivo, o levei ao nariz e cheirei.

Cheiro de ferro. Cheiro de sangue.

Meus olhos começaram a marejar enquanto eu avistava outras pequenas mechas de cabelos azuis. Parecia uma trilha.

Comecei a seguir devagar, aumentando o ritmo até que estivesse correndo. E visse dois corpos jogados em frente a uma árvore. Rodrigo e Kauany. Gritei, correndo ainda mais rápido e soluçando.

Os dois não tinham nenhum sinal de ferimento ou sangue.

Foi como se um analgésico fizesse efeito quando peguei o braço de Rodrigo e percebi que estava quente e ele tinha pulsação. Kauany também.

Comecei a chacoalhá-los.

-ACORDEM! ACORDEM! GENTE, ACORDEM, MEU DEUS, ACORDEM!

A garota foi a primeira a abrir os olhos e logo começou a se levantar, esfregando o cabelo e cutucando Rodrigo, qua também já estava acordado.

-O que... o que aconteceu? - Kau balbuciou.

-LEVANTEM!

Berrei.

Molengos e desnorteados, os dois começaram a se levantar sem entender nada. Até que um lampejo de reconhecimento tomou conta da face de Kauany.

-Meu Deus, aonde a gente tá? Cadê o João?

Ela começava a andar em circulos. Rodrigo se aproximou e tocou o meu cabelo.

-Você tá chorando?

Funguei.

-Escutem, tem algo errado. Quando a gente discutiu eu segui a frente, vocês lembram?

Ambos assentiram. Comecei a falar rapidamente.

-Então quando eu me virei pra chamar vocês, vocês tinham sumido. Assim, do nada! Aí eu achei o celular do João - levantei o aparelho - e comecei a seguir nessa direção. Então eu vi uma mecha de cabelo azul e logo outras, pareciam uma trilha de cabelos azuis e... e-eu encontrei vocês.

Horrorizados, os dois andaram para atrá de mim para olhar o chão. E ver com os próprios olhos. Kauany tampou a boca para abafar um grito. Rodrigo parecia a beira de um ataque cardíaco.

-A gente tem que sair daqui!

Ele pegou a minha mão e a de Kauany e nós três começamos a correr o mais rápido que conseguíamos.

Já estávamos sem fôlego e suados quando avistamos uma rua de terra e algumas casas. O vilarejo estava próximo!

Corremos até a curva da ruazinha e só então paramos para tomar ar. Kauany começava a chorar, arrancando as sandálias dos pés e as jogando fora. Ficando descalça.

-Precisamos pedir se alguém viu o João! - Exclamei para Rodrigo, que tirava a camisa.

Ele a jogou sobre o ombro esquerdo.

-Vamos até aquela primeira casa - apontou para um imóvel verde de madeira.

Nós seguimos até lá sob os olhares de um senhor sentado em frente a um mercadinho. Rodrigo não perdeu a oportunidade e gritou, perguntando se o homem havia visto um garoto de cabelo azul.

Não.

Na frente da casa verde, havia duas crianças pequenas brincando com uma bola e duas mulheres de meia-idade conversando. Rodrigo perguntou a mesma coisa para as quatro.

Não.

Seguimos perguntando por todas as casas da ruazinha. Ninguém havia visto João. Ninguém sequer já tinha visto uma pessoa de cabelo azul.

Quando nos sentamos no chão a frente de uma porteira ao lado da última pequena casa no lado esquerdo, estávamos exauridos em todos os sentidos.

-Gente, será que o João morreu? - Kauany choramingou, levando um olhar mortal de Rodrigo.

-Cala a boca, Kau, a gente vai achar ele. Provavelmente ele... pregou alguma peça na gente...

Mas nem o próprio Rodrigo parecia acreditar no que falava.

-Eu tô preocupada!

-Eu sei, eu sei.

Ele a abraçou e lhe deu um beijo no rosto. Nós três ficávamos quase mais calmos, quando ouvimos um grito de pavor vindo de algum lugar atrás da gente.

Levantamos automaticamente para ver o que acontecia. E pulamos para o lado rápidos o suficiente para não levarmos uma pancada da porteira, aberta por uma mulher que corria desesperada, carregando uma cesta repleta de chás e frutas. Ela parou na rua quando nos viu.

-Sa-saiam! Não venham aqui! Eu vou ligar para a policia! Mãe de Deus!

E ela correu pela rua sem nos dar a chance de perguntar o que acontecia. E quando eu Kauany nos viramos para falar com Rodrigo, o mesmo já corria porteira a dentro pela estradinha de terra cercada por uma mata. Foi quando eu lembrei.

Vilarejo que dava para a propriedade abandonada.

Nós duas nos olhamos e corremos atrás dele.

Até que de repente ele cambaleou, caindo de bunda no chão.

E quando nós chegamos até onde Rodrigo estava, quase caímos também. Horrorizadas, de pernas bambas. Kauany só sabia gritar e eu não conseguia me mexer.

Amarrada com um pedaço de corda e com um rosário azul jogado por cima de qualquer jeito, estava a cabeça de João na cerca de madeira.

Ao lado de uma das tábuas em horizontal, que tinha um recado escrito em vermelho.

Escrito em sangue.

PEGUEI

"SATANÁS, VEM ME PEGAR SEU CAGÃO!"

❖❖❖
Apreciadores (9)
Comentários (4)
Postado 15/10/16 09:32

Gostei muito do conto! Achei os personagens convincentes (diálogos e reações) e os acontecimentos prendem quem estiver lendo. Só uma observação: no final da história, no parágrafo que começa com "Amarrada...", a palavra "jogado" foi escrita duas vezes.

Postado 15/10/16 12:40

Que bom que gostou! :D

Eu adoro creepypasta, eu procurei me inspirar em algumas que eu conheço.

Oh, muito obrigada! Eu revisei várias vezes e não percebi :/ valeu mesmo!

Postado 16/10/16 10:34

Oiii!

O texto está muito bom, gostei imenso! Quase parece um filme de terror, toda a acção está muito bem pensada.

Julgava que todos iam acabar por morrer ou que então a Renata fosse ser possuída pelo rosário e começar a matar gente, ahahahaha. Mas gostei de como tudo terminou. o/

Boa sorte no concurso!

Inteh! o/

Postado 16/10/16 13:23

Me inspirei em algumas creepypastas além de alguns casos... reais O.o

Pra ser sincera eu tbm pensei em matar todos kkkk

Muito obrigada, moça :D

Postado 04/02/17 06:09

Texto de terror do jeitinho que eu gosto rs Parabéns!

Postado 04/02/17 15:19

Que bom que gostou :) Obrigada!

Postado 05/10/22 14:51

personagens realistas (até de mais) com aquele gostinho que sinto quando leio algumas creepypastas, tem combinação melhor?

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