Estime-se
Aiori Von Satts
Tipo: Conto ou Crônica
Postado: 14/01/17 00:37
Gênero(s): Drama Reflexivo
Avaliação: Não avaliado
Tempo de Leitura: 5min a 6min
Apreciadores: 3
Comentários: 1
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Usuários que Visualizaram: 10
Palavras: 827
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Livre para todos os públicos
Notas de Cabeçalho

Também postado no Nyah! Fanfiction.

Espero que gostem <3

Capítulo Único Estime-se

Eu costumava me olhar no espelho apenas para sentir você. Seu abraço sempre me envolvendo, quente e suave, desenhando um sorriso em meu rosto.

Adorava ser o canal por onde todos te enxergavam; seu receptáculo. Eu andava e lá estava você, ao meu lado, atrás e dentro de mim, sempre sussurrando o que eu precisava para continuar pondo um pé após o outro.

“Ele não merece você”, foi o que me disse no outro dia, se lembra? Quando Daniel simplesmente fechou a porta de nosso apartamento para mim, nu até a cintura, brilhante pelo suor de uma noite bem aproveitada.

“Essa saia te deixou mais magra”, quando quis impressionar Rafael, meu novo ficante. Acabou sendo apenas aquele dia, uns beijos no carro e a promessa de uma ligação que nunca aconteceu. Confesso que duvidei de você, chorei e berrei ao meu reflexo algumas verdades inventadas. As mesmas que sua voz calma, doce e aconchegante sempre abafavam, pronunciando, dia depois de dia, as verdades em que eu deveria acreditar.

Sinto tanta saudade de nossos momentos! São manhãs obscuras sem você, onde eu me olho e “estou flácida”, “preciso emagrecer”, “ninguém jamais irá me querer”, ou qualquer outro pensamento autodestrutivo passa pelo meu cérebro. Não sei de quem é a culpa — embora desconfie que seja minha —, mas essa nova consciência, entregada a mim por um desconhecido de péssimo humor, não é nada fácil de aturar. Ficar repetindo, de novo e de novo, “não é verdade” é um pé no saco.

Claro, eu poderia simplesmente acreditar nele. Nesse novo ninguém iludido que pensa ser digno de te substituir. Mas não. Vou te esperar, não importa o quanto demore; não importa a dificuldade que tenho de ver felicidade no mundo sem você aqui.

Nossas memórias me ajudam nessa tarefa árdua, de qualquer forma. Principalmente as últimas, onde você já começava a ficar translúcida para os meus olhos embaçados, virando um fantasma do que fora tempos atrás.

Aquele dia no balanço, por exemplo. Não havia ninguém lá, mas ainda assim eu me sintonizei com a sua presença. Foi logo depois do acidente que destruiu o meu bem mais precioso. Vendo agora, eu era uma jovem bem idiota. Tratar seu rosto ou o corpo de academia como a coisa mais importante em si mesmo não deve ser certo. Sai correndo quando vi meu reflexo pela primeira vez, as lágrimas molharam meu moletom cinza e pingaram silenciosas no chão. Corri até minhas pernas arderem, o céu da madrugada ficar alaranjado e quase esquecer do que estava fugindo. Então achei meu segundo lugar preferido no mundo. Um balanço vermelho gasto, com vista para um aterro sanitário, totalmente solitário. “O local perfeito para um monstro como eu”, era o subtítulo para ele em minha cabeça. Confesso que não lembro o título em si, mas isso não importa.

Eu gritei tanto. Gritei ofensas e gritei preces; gritei ódio e gritei socorro. Não tinha percebido o quanto estava quebrada até aquele momento, mas você sempre soube. Apareceu dizendo seu costumeiro boa noite, sentou-se ao meu lado e cantou sobre uma garota linda, vestida de nuvens carregadas de raios, pronta a se tornar uma tempestade. Na música ela era fogo, dançante e hipnotizante; era água, suave; ar, sempre adaptável; e era terra, segura e forte. Nós bailamos ao som de sua bela voz e você me deitou em seu colo, acariciando meus cabelos embaraçados enquanto repetia que precisava ir.

— Você não me deixa mais entrar, então irei embora. Vou, mas volto no momento em que deixar uma fresta na porta para mim.

— Mas eu preciso de você... por favor — eu chorei, agarrei seu casaco e a fiz olhar em meus olhos. Eles estavam tristes e demonstravam dor. Aquilo me aterrorizou. Aquelas emoções ruins nunca estiveram antes em suas esmeraldas.

— Eu não posso ficar se não me deixar entrar, meu amor. Me perdoe.

— Por favor...

Repito isso até hoje, dez anos depois. Escrevo meus relatórios e peço; cozinho e peço; alimento o gato e peço; durmo e peço. Peço por você, por sua volta, por seu amor... pela chance de termos mais memórias as quais eu possa me agarrar.

A música daquela noite ainda toca no fundo dos meus dias. Uma trilha feliz em dias nublados. Não sei de onde saiu, mas foi a melhor coisa que já ouvi.

Sabe, estimada Autoestima, você foi a melhor. Melhor amante, melhor amiga, melhor imaginação. Nunca foi uma pessoa, mas era minha pessoa favorita no mundo. O primeiro melhor lugar era estar debaixo de sua proteção. Sei que vai me ouvir, não importa onde esteja, não importa que, na verdade, eu esteja escrevendo, então quero te confessar uma coisa:

Eu te amo. Deveria ter dito isso antes, ao invés de te chamar de mentirosa simplesmente porque você me achou bonita, enquanto, para mim, todas as roupas evidenciavam meus piores ângulos. Digo agora então, quantas vezes for necessário.

Eu te amo.

Por favor, volte.

Eu te amo.

A porta está entreaberta.

Eu te amo.

❖❖❖
Notas de Rodapé

Obrigada por ler =D

Apreciadores (3)
Comentários (1)
Postado 09/09/17 21:10

Caramba! Eu amei, simplesmente amei!

Essa narrativa calma e explossiva, apaixonante. Sinceramente, vi-me presa a hostória até o final... E que final! Achei que ela era louca no início, porém, ao desenrolar da história, revela-se que não é bem assim. Genial!

Preciso confessar que nessa parte: "Sabe, estimada Autoestima, você foi a melhor. Melhor amante, melhor amiga, melhor imaginação". A surpressa foi muito grande, caiu-me o queixo, AHAHHAHAHAHHA.

Agradeço por compartilhar sua obra genial conosco, meros mortais.

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<3