“Como é ser divino?” Sempre me pergunto, enquanto viro dum lado pro outro na cama. Penso em uivar as tormentas do meu peito magrelo para o silêncio da lua, sei que fraquejaria tentando ser escutado, entretanto eu faria, e fazendo estaria esgotado. No fim, sem energia.
Com certeza, nalgum lugar por mais mísero, diz pra mim Jesus-Buda-Oxalá, existem pessoas que me bajulariam. Fariam oferendas, procissões, esculpir-me-iam em sabonete barato e rezariam. De longe por ser perfeito, sim por ser simples. Seria tão bom ouvir agrados sobre a compaixão...
Planto todo tipo de semente, todo dia, e cadê meus frutos? Dou informação, acompanho até a estação de metro, formato computadores, faço bolo, e faço o favor de jogar bituca perdida na lata de lixo. Assim fica fácil ir pelo caminho maligno, merda!
Falo. Falo duma vez: ser bonzinho não dá lucro nem banana alguma. É acachapante a falta de valorização, mas não é culpa de ninguém — pelo menos não na visão curta das coisas. A galera está acostumada com gente babaca e se encoleriza quando alguém legal parece; e os legais estão sem saco, é muita gente pra ajuda. E nem se fale tamanha babaquice virando ordem real, pessoas adorando quem não faz nada me dá umas dores de cabeça.
Infelizmente também estou sem saco, recentemente, pra esse tipo de coisa. Poxa vida, será que é tão difícil agradecer sem buscar algo de ruim na ajuda? Queria ter algo de divino, aí ajudaria sem minhas forças acabarem, e se mesmo assim eu der piti, esconder-me-ia no meu céu particular. Poderia livremente brincar de ser divino.