Liza
Antes mesmo do meu motorista dobrar a esquina da rua de casa, eu já havia escutado o barulho das sirenes. Só poderia ser o de sempre, algum espertinho tentando assaltar o condomínio.
Senti uma alfinetada no ventre, no umbigo para ser exata, esquecendo qualquer que fosse o problema. Fechei os olhos e curvei um pouco meu corpo para frente, apesar de passageira, havia sido muito desconfortável. Aquilo apenas aumentou minha enxaqueca. Com o semblante fechado, abri a bolsa a procura de alguma aspirina.
— Marcus, abaixe mais o som, por favor. — pedi, lançando dois comprimidos à boca, engolindo com a pouca saliva.
Marcus estava sempre disposto a cumprir meus pedidos, mas dessa vez isso não ocorreu.
— Senhora! — me chamou de uma forma diferente. Ele estava inquieto. Pela voz, sua garganta parecia mais seca do que a minha.
—Sim. — Olhei para frente.
Antes mesmo que meu motorista pudesse dizer uma palavra, encarei a cena que o vidro do carro me permitia assistir. Uma multidão se formava na entrada de minha casa. Havia duas viaturas ali e muito falatório.
Ele, então, parou o carro.
— Mas... o que será que aconteceu? — perguntei, perdida. Ninguém havia me avisado de nada.
Desci do carro um pouco tonta, me apertando em meio a multidão. Algumas pessoas me olhavam indiferente, outras balançavam a cabeça negativamente. Em meio aos rostos de curiosos, avistei uma de minhas funcionárias.
— Mara! Mara! — Alcancei seu ombro. Ela virou o corpo com o meu toque. Seu rosto estava pálido e aos prantos. — O que está acontecendo? Assaltaram a casa?
— Não! — respondeu, entre os soluços. — Ah, senhora! É a Evi. Estão prendendo a nossa menina.
— Q-que?? — Mara só poderia estar desequilibrada. Minha filha nunca teria motivos para ser presa.
Olhei para as escadas de entrada. Minhas pernas amoleceram. Evelin estava sendo praticamente arrastada por dois policiais.
— Me soltem! — ela berrou. — Eu não fiz nada! Aquilo não é meu! — Minha menina se debatia, chorando. — Meus pulsos! Meus pulsos estão doendo!
Me apavorei tentando passar.
— Tirem as mãos da minha filha!
Minha voz fez Evelin olhar para a minha direção.
— Mamãe! — Seus olhos verdes dilataram a procura de proteção.
Uma lembrança antiga dela, aos 6 anos, debruçada sobre o piano de casa por não conseguir tocá-lo, me invadiu. Seus olhos estavam como naquela tarde, me pedindo ajuda e proteção, pois a professora rígida iria chegar em poucas horas.
Balancei a cabeça para dissipar a lembrança boba, se comparada ao caos que se encontrava ali.
Tentei alcança-la, mas alguém me puxou pelo braço. Era Nando.
—O que houve? — Me agarrei em sua camisa. Seu olhar era de decepção.
— Vamos entrar, querida. Lá dentro conversaremos melhor.
— Não! — Evelin gritou. Um dos policiais a enfiava bruscamente na viatura.
— Ei! — Tentei caminhar, mas Fernando me impediu novamente. — Está machucando ela!
— Estão fazendo o trabalho deles, meu bem. Vem, vamos entrar.
Olhando o carro se distanciar, não sei se minha pressão subiu ou baixou. Tudo de repente escureceu.
Evelin
Será que foi um pesadelo? Será que ainda estou dormindo?
Minha visão estava embaçada e minha respiração um pouco lenta. Na verdade, tudo parecia em câmera lenta. Acho que apaguei.
Olhei ao redor e logo a imagem em minha frente começou a ficar nítida. Quem dirigia tinha pressa. Pelas janelas eu via apenas o nada. Ergui as mãos e ali estavam as algemas grudadas em meus pulsos, me dizendo que não era sonho. Minha respiração acelerou.
O pesadelo era real.
— Para onde estão me levando? — perguntei, já aos prantos novamente, sentindo uma ardência do canto da boca.
Foi então que senti o sangue seco. Lembrei do por que eu tinha apagado. Um tapa forte e certeiro para cessar minha voz.
Derick estava no carona, ele me olhou e logo sorriu, fazendo aquele bigode fino parecer ainda mais ridículo.
— Olha quem acordou! — o cara no volante disse, me olhando também. — Fica pianinho, princesa! Estamos quase chegando.
—Por favor, me levem de volta para casa!
Ninguém me respondeu.
— Droga! Essa hora não passa! — Derick reclamou, se ajeitando no banco. — Vamos ter que rodar por mais uma hora.
— Eu sei de algo que poderia fazer o tempo passar rapidinho. — Senti um calafrio com aquela frase. Olhei para o motorista e vi quando me mandou um beijo. — O que acha, princesa?
— Deixa a garota, Max!
Me encolhi atrás do seu banco, fugindo de seus olhos. Olhei para fora e vi alguns carros passando.
— Aqui! Socorro! — gritei, batendo no vidro. — Aqui!
— Já chega!
Um barulhinho me fez olhar para eles. Arregalei os olhos ao ver Derick me apontar uma arma.
— Não, não! Por favor!
— Chega de chororô! Ninguém aqui vai te tocar. Então cala a droga dessa boca. Pode fazer isso ou precisa de ajuda?
Me encolhi ainda mais, lutando fortemente para engolir o choro.
Eu não estava acreditando que Fernando teve coragem de fazer isso. Lembrei de suas palavras sobre a morte do meu pai. Como ele pode assassinar o homem de lhe deu uma oportunidade na vida? Como pode ser tão frio e ingrato?
Meu peito ardia ainda mais de saudade. Se meu pai estivesse aqui, nada disso estaria acontecendo.
Chorei amargamente em silêncio.
Tempos depois, o carro estacionou. Estava escuro demais para eu identificar onde estávamos.
— Saia! — Derick ordenou ao abrir a porta.
Senti minhas pernas um pouco dormentes. Não sei por quantas horas ficamos naquele carro, mas acredito ter sido muitas. Meu corpo estava todo dolorido.
— Bem-vinda ao lar! — Max bradou, segurando meu braço, me obrigando a caminhar. — Ah, e claro! Feliz aniversário. — Derick riu baixo, passando em nossa frente. Max continuou: — Você sabia que 18 aninhos é sinal de que já pode responder por seus atos? Olha, eu não sei o que você aprontou para o Cupper ficar tão zangado, mas de uma coisa eu não tenho dúvidas... você está bem encrencada.