Parede
Meiling Yukari
Tipo: Conto ou Crônica
Postado: 18/10/22 09:39
Avaliação: Não avaliado
Tempo de Leitura: 8min a 11min
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Palavras: 1333
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Não recomendado para menores de dezoito anos
Notas de Cabeçalho

Gatilho de violência doméstica.

Capítulo Único Parede

Roberto havia se mudado recentemente para a grande casa no centro da cidade. Fora um achado e tanto, afinal, o preço estava bastante em conta. Ficou muito feliz!

Mas a verdade era que teve que se mudar devido ao seu trabalho, e por conta disso havia deixado muitas coisas para trás, afinal, tivera que se mudar de estado, muito longe de sua terra natal, e nada conhecia por ali.

No começo tudo era calmo e monótono, silencioso até demais, o que incomodava Roberto. A única exceção era a parede de seu quarto, que virava e mexia soltava um pequeno som de gotejar.

Ele não tardou a se incomodar com tal barulho, tanto quanto se incomodava com o silêncio, e resolveu chamar um encanador para verificar de onde vinham os sons de água.

O pobre coitado do encanador ficou lá por duas horas, mas não ouviu som algum de água, e saiu enfezado dizendo que não podia haver canos naquela parede, afinal não havia nenhum banheiro nem nada que se utilizasse de água por perto.

Mas não precisou nem de três minutos após a saída do trabalhador para o irritante barulho de gotejar preencher a casa.

Roberto tentou não ligar. As semanas foram se passando e ele foi se acostumando ao local, afinal a cidade era divertida. A única coisa não divertida era o barulho insistente que nenhum dos quatro encanadores que Roberto chamou conseguiu resolver.

O homem então tentava passar a maior parte do tempo fora de casa. De dia trabalhava, de noite ia para a noitada. Em suas andanças de bar em bar, ele fez várias amizades, e ouviu sobre muitas histórias da cidade.

Tinha aquela engraçada de quando um prefeito em 2004 perdeu as calças durante um discurso e ficou só com a cueca rasgada no cu, e ele sem saber do furo, se abaixou para pegar as calças e pronto, a cidade inteira riu dele.

Teve aquela outra triste, do pai que era policial, anos 80, e uns bandidos sequestraram a filha dele como forma de vingança, e no final devolveram a menina em pedaço por pedaço. Foi o maior choque da época.

Teve também o trágico incêndio que consumiu boa parte da cidade, foi lá pelos anos 20, e das poucas casas que existiam na época, quase nenhuma ficou de pé. Foi um incêndio muito trágico, morreram muitas pessoas em um sofrimento enorme.

E teve aquele escândalo dos evangélicos que foram presos por tráfico de órgãos. Anos 70 mais ou menos e eles fingiam que tratavam da saúde de crianças enfermas, na igreja, mas na verdade faziam cirurgias para retirar seus órgãos e logo mandavam as crianças para casa, que morriam em questão de dias, e os cortes eram atribuídos ao diabo.

Roberto gostava de ouvir as histórias, era um passatempo para ele. E quase sempre ele podia ver que uma moça sempre o observava de longe. Uma linda moça, gostosa e bonitona. Até que um dia ele resolveu criar coragem para chegar nela.

Foram momentos agradáveis de muita conversa jogada fora. Se divertiram, beberam juntos e por fim resolveram que a maior necessidade da vida deles era transar até o sol raiar. Ela disse que morava com os pais, então partiram para a casa dele.

Mal abriram a porta da sala e já começaram a se pegar loucamente. Se enroscaram em meio aos beijos ardentes e caíram no sofá. A moça ficou por cima, se esfregando no membro já endurecido do rapaz, que começou a tirar a blusa.

Mas nesse momento a moça saiu saltitando, e disse que teriam que brincar de pega-pega que ele quisesse pegar ela de verdade. E saiu correndo pela casa, indo de cômodo em cômodo até que por fim chegaram ao quarto.

Roberto pulou em cima dela e tentou levá-la até a cama enquanto lhe beijava o pescoço. Mas mal teve tempo de encostar a bunda na cama, pois a doce jovem rolou para trás, gritando um som agudo e alto, algo como uma risada diabólica misturada com dor.

O pobre homem paralisou de medo, enquanto ela continuava gritando e se debatendo no chão com muita força, como se estivesse sendo possuída por um demônio. Seu corpo começou a flutuar e se desfazer em sangue enquanto pedaços da sua carne iam caindo e se desfarelando.

Foi a vez de Roberto começar a gritar enlouquecido de medo com aquela visão do inferno. E nesse momento o corpo de aparência apodrecida começou a falar:

– Fazia muito tempo que eu estava esperando... Muito tempo na espreita, décadas de solidão e sofrimento. Eu era uma doce jovem, como essa aqui que estava louca para copular contigo. Eu era jovem e alegre, recém casada, tinha uma vida inteira pela frente. Mas do dia para a noite meu marido se transformou em monstro, me bateu até me deformar, isso durou vários dias seguidos de dor e sofrimento... até que terminei por morrer...

Roberto não acreditava no que estava vendo, a moça havia se despedaçado bem na sua frente, e agora seus restos mortais fediam tanto que seu estômago se embrulhou e ele vomitou fartamente. Tentou se recompor, e perguntou o que o espírito queria. Ao que ela respondeu:

– Quero que pegue um martelo e comece a quebrar essa parede maldita que me aprisionou durante quase 100 anos.

– Mas como assim? Não estou entendendo nada... – reclamou o rapaz.

– Faça o que estou mandando, que irei te contando durante seu trabalho.

E assim foi Roberto buscar um martelo e começou a marretar toda aquela parede de onde vinha os sons de água.

– Era você que fazia os barulhos? – indagou o moço enquanto usava toda sua força para destruir a parede.

– Sim... eu queria chamar a atenção, e queria perturbar a paz de qualquer homem que visse morar aqui. E então eu queria pegar a fêmea com quem ele fosse se deitar, e estraçalhá-la para que em estado de choque, o tal homem pudesse seguir minhas ordens e abrir a parede.

– Mas o que tem na parede? – mal terminou de perguntar, um bloco de cimento caiu da estranhamente grossa parede.

A parede tinha aproximadamente 1 metro de espessura, coisa que Roberto jamais havia reparado, pois o armário embutido do corredor disfarçava essa parte da anatomia da casa. E o pobre homem quase teve uma parada cardíaca quando atrás do bloco de cimento caído estava o corpo de uma jovem, em um estado mumificado e horrendo.

– Meu doce corpo!! – suspirou o espírito.

– E agora? O que eu faço? Cacete que coisa horrorosa...

– Agora você liga para a polícia!

– Mas vão achar que eu matei a moça, eu não quero ser preso por algo que eu não fiz porra!

– Ou você liga, para eles virem enterrar meu corpo, ou você vai acabar como ela! – grita o espírito.

– Tá... Tá... Mas só ligo se você me contar como que aconteceu exatamente para seu corpo ter ficado aí preservado esse tempo todo...

– Quando morri, meu marido teve que se livrar do corpo, não é? Então abriu a parede e me enfiou aí dentro. Mas ele ficou com medo que eu apodrecesse e fedesse, então ele me enrolou nesses tecidos estranhos, jogou uns produtos químicos e me cimentou para sempre. Só que daí veio o grande incêndio. Essa é uma das poucas casas que sobreviveu e está de pé até hoje... Meu maior consolo é que meu marido morreu agonizando no fogo, bem aqui no quarto.

Comovido com a história, o rapaz liga a polícia sem se importar com mais nada.

Mas o pobre coitado nem teve tempo de encarar a lei, pois o espírito era trapaceiro, e assim que a ligação foi terminada, ela tratou de possuir o corpo do homem, e foi arrancando sua pele enquanto ele gritava de tanta dor.

Sem pele, foi muito mais fácil de tornar o corpo todo dele em uma gigantesca massa de carne moída empapada em sangue. Agora sim, Elizabeth poderia descansar em paz, ninguém vivo saberia seu segredo, e seu corpo finalmente poderia ser sepultado como merecia ser.

❖❖❖
Notas de Rodapé

Bom, a parte do corpo dentro da parede foi claramente inspirada em Edgar Allan Poe.

O resto veio da minha imaginaçãozinha.

Obrigada pela leitura <3

Apreciadores (1)
Comentários (1)
Postado 19/10/22 21:10

Caramba, que texto incrível! Me vi fissurada na narrativa e boquiaberta quando tudo começou a se revelar. Assustador, aterrorizante e muito triste.

​Obrigada por compartilhar conosco!​​​

​​​Parabéns, Mei ♥

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