Excluída pela minha cor,
Fui forjada pelos gritos de dor
Daqueles que o preconceito calou.
Nasci ouvindo que o cabelo crespo é ruim,
Cresci vendo que o negro é ruim
E talvez eu morra sem poder dizer algo sobre mim
E sobre aqueles que nadam no meu sangue carmim.
Sou a Vênus que nunca foi pintada nas grandes telas
E a Primavera¹ que não pôde florescer nas pinceladas:
Não há espaço nas artes para as negras.
Sou a musa que nunca inspirou
E a passante² que nunca te encantou:
Não sou a mulher que Baudelaire versou.
Sou a Deusa em decadência
Que nasceu da violência:
A preta não é exemplo de resiliência.
Sou exemplo de ruindade
Para que a branquitude pratique a bondade:
Para onde foi a humanidade?
O âmago guarda as chicotadas do passado
“o preto só vai ter fracasso”
E o peito só ouve o silêncio divino
“Deus não aceita a cor do pecado”.
Nasci sentindo que não era bem-vinda,
Cresci ouvindo que ser negra é não ser bonita,
Mas não vivi escravizada pelo seu preconceito
Que olha pro meu Exu e sai correndo.
Negra como a noite…
Ainda bem!
A noite é linda
E eu também.
Negra como minhas antepassadas…
Que alívio!
Elas eram fortes
E eu também sou.
Preta como a tinta que escreve estes versos…
Que honra!
Ela escreve a história
E eu também.
Diminuída pela minha cor,
Mas não há dor
Que possa arrancar as raízes da resistência
Da nossa existência negra.