Me senti incrivelmente obrigado a escrever uma entrada a respeito. Quem sabe vire algum post no fórum, mas não estou com disposição para tanto, ao menos não agora. Escrito numa sentada, da boca (do dedo) para fora, sem correção, apenas indignação.
Vê-se, hoje em dia, a onda de produções de textos com Inteligência Artificial (para citar o senhor da guerra do continente africano, pai de Sambubu, é inteligente apenas no nome, embora certamente seja artificial), nos quais seus geradores costumam jurar, de pés juntos, que têm sim grande parte em sua "criação". Ora! Contemplem o esforço hercúleo: digitar um parágrafo malfeito numa caixa, apertar enter, esperar de vinte a trinta segundos, copiar, colar. Uma tarefa titânica! Que comendável! E mesmo que se preste a "corrigir", ainda está lá, pois um texto gerado por essa ferramenta nunca é aceitável. Repare a frase: nunca é aceitável, para não haver margens para segundas interpretações. Quero dizer o que digo. Nunca é aceitável. O que sai da máquina é apenas "boa escrita" apenas e somente para quem não sabe o que é uma boa escrita (essa frase também não oferece segundas interpretações). Diria que é o pior dos males dessa onda, porém existir um "pior" implica um "menos pior", e não há para nós escapatória, é tudo muito ruim.
O que não entendem é que "escrever" nem sempre é o resultado. É amar as palavras, é ter paixão pela linguagem. É compor, mesmo que de maneira imperfeita, uma cena, um raciocínio, um causo, um roteiro, uma estrofe (uns versos)... A graça está em compor, em trabalhar com as palavras, em ver o que se pensa tomar forma e contar a vida. Lemos livros sobre amor, sobre traição, sobre amadurecimento, sobre perda durante todo o nosso percurso aqui na Terra — e mal nos damos conta que a maneira como se conta uma história é o fator mais potente de todas as narrativas. Quem conta pode estar mentindo, pode não saber, assim como pode conhecer de tudo um pouco e falar apenas a verdade — mas transformar as pessoas em animais, e vice-versa —, e aí está o poder das palavras. Quando temos esse poder (essa manipulação) como hobby, entendemos no começo como uma questão de produto, de volume, de finalizações. Contudo, o que mais nos dá prazer é a escrita. É o fazer. É o processo. E se alguém elimina o processo, então não há arte, pois não há intenção, crenças, valores, pensamentos, ideologias, histórias de vida, bagagem cultural, bagagem linguística, humanidade.
Essa escrita é facilmente identificável para quem lida com ela ou para quem lê bons livros. É pobre, e não merece mais do que duas linhas.
“Mas não sei escrever!”, pois aprenda.
“Mas não tenho tempo!”, como qualquer hobby, pede seu tempo — a tradução já nos diz: hobby = passatempo.
"Mas uso apenas para revisar!", dispensa comentários (o quão charmoso é um erro de concordância?).
Se fazemos algo por passatempo, naturalmente esse algo (aqui, a escrita) nos traz contentamento, alegria, prazer etc. Quando finalmente somos lidos e nossas mentes dialogam com as dos leitores, imaginando coelhos numa jaula (ou qualquer cena descrita), vem mais uma onda: puxa vida! Alguém gostou! Alguém leu! Nem que seja uma (1) pessoa, é sempre um puxa vida! A partir dos puxa vidas, cria-se um acervo pessoal, com uma ou duas leituras, dezenas, talvez centenas, de textos, que, como uma galeria num blog pessoal, é uma parte da vida de alguém.
A regurgitação e todo esse vômito produz em massa textos sem qualidade ou profundidade, sem humanidade, que não nada além de embalagens a flutuar sobre o oceano. Ninguém lê. Os textos não são para ninguém, porque quem escreveu não irá lê-los, e nenhuma pessoa consome conscientemente esse tipo de produção. Quando descobre do que se trata, abandona. É lixo. Lixo flutuante no oceano. Lixo, apenas.
A pessoa abandona a própria dignidade para não receber nada, nenhuma migalha, nadica mesmo, necas de pitibiriba. Não se deu ao trabalho de criar, não se deu ao trabalho de escrever e recebe, portanto, o único prêmio possível e aceitável para tanta inutilidade: o silêncio. Então, ficam sem entender, mas não é como se entender fosse o forte da casa. Não entendem nem mesmo o conceito de passatempo (não o biscoito), vão entender o de lixo? Impossível.