All Star Azul
Maria Vitoria
Tipo: Conto ou Crônica
Postado: 10/04/17 11:02
Avaliação: Não avaliado
Tempo de Leitura: 4min a 5min
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Palavras: 655
[Texto Divulgado] "O Jarro De Carne" O recém formado doutor Haward, inicia sua jornada de trabalho ao lado de seu mentor. Juntamente com sua equipe, ele inicia um experimento que mudara, para sempre, o futuro da humanidade.
Livre para todos os públicos
Capítulo Único All Star Azul

Ainda me lembro do sorriso daquela mulher.

Chuva em São Paulo, transito parado, um mar de gente encharcada se amontoando em baixo de alguma meia proteção.

- Oi, tudo bem? Lembra de mim?

Sorri com todos os dentes que ainda restam em sua boca levemente torta.

- É, acho que sim. Como você está?

Um pano preto cobre suas costas enquanto as mãos atentam-se ao volante e o botão que aciona as portas laterais.

- Nossa que chuva estranha né?

Olhos tão cintilantes e esperançosos que nem a mais doce das crianças possui.

- É, pior que a cidade toda para.

Os olhos dele não brilhavam e ele não sorria de uma forma espontânea.

Uma corcunda em suas costas, cabelos negros opacos, cicatrizes de acne em estágio avançado por todo o rosto, uma pequena boca salientemente pendida para a esquerda, dentição em precariedade, um perfume doce almiscarado, misturado com chiclete de hortelã e tabaco.

Corpos aos montes se entreolhando enquanto enxugavam a água que escorria dos cabelos e empapava ainda mais as vestes já em declive pela chuva. Um monte de braços, cotovelos, punhos, mãos e dedos, tentando se escorar num mastro firme para que a pressa vinda do acelerador não os levassem para além de seus dois centímetros de espaço breve. E havia vozes, vozes que praguejavam, vozes que falavam de forma turva sobre relacionamentos heterossexuais e vozes que perguntavam como está fulaninho, o ex viciado em cocaína.

Perante ao caos que se aproximava da meia noite, uma mulher com uma juventude enterrada por um passado desuniforme surge...

Ajeita. Desajeita. Escorrega. Mantém a postura. Sorri. Esconde o sorriso. Deixa os olhos brilhares. Esconde o olhar. Tenta mais um assunto. Se cala. Afasta o pano preto. Deixa o pano preto encobrir. Olha as horas. Coloca os fones de ouvido. Começa a cantarolar uma música. Emudece. Me olha. Não me olha. Tenta mais uma apresentação. Sorri...

Diante de tantas expressões e tentativas de aproximação, pude ver no deslumbre da força daquela mulher uma invisibilidade escorrer pelos degraus, transpassar a porta, pingar no asfalto, encontrar a chuva e juntas escorrer dos bueiros aos córregos. Admito, nunca vi tanta vontade de viver, tanta vontade de ser notada, tanta vontade de ser amada e desejada como eu vi nas falas corporais desta mulher. Por um segundo pude sentir que a vida ainda tinha algum sentido e a humanidade uma parcela de salvação. Chega a ser engraçado como mudamos e nos reinventamos diante de outras pessoas, fazemos coisas sem sentido ou com um milhão de significados, porém atitudes estas que são tão claras e absolutas somente para nós mesmos. Fico a pensar então, será que o amor tem mesmo destas coisas? Sabe, dessas coisas de surgir através de um olhar, como se fosse amor à primeira vista? Ou através do fato de se sentir vivo e apto para amar um outro alguém e automaticamente este outro alguém te amar de volta, ou ainda mais, ou apenas simples percepção de que somos tão ingênuos e carentes que antes de sermos apenas um, temos a necessidade incansável de sermos dois?

Aposto que esta mulher irá se olhar no espelho antes de embarcar em sonhos e irá se sentir completa, feliz e amada. Afinal, um homem a olhou e ela olhou ternamente este homem e por frações de milésimos de segundos, ela se viu sendo feliz ao lado deste homem, os viu sendo completos e solícitos um com o outro numa idade lá longe, com todas as suas seguranças e estabilidades, com seus filhos e netos a correrem ao seu redor brincando e amando uns aos outros na mesma proporção que estes dois, ele e ela, ainda se amam.

Uma chuva forte ainda tornava a despencar do céu. Passei a catraca. Dei sinal. Desci. Apertei a campainha. O porteiro demorou a abrir. O elevador estava parado no décimo segundo andar. Pensei... acho que o amor tem dessas coisas, igual aquela música do Reis, sabe, All Star Azul?

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Apreciadores (1)
Comentários (1)
Postado 03/01/18 01:54

Quanto amor! Quanta graciosidade numa obra só! Tô morrendo de amores. Meus parabéns ❤

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