Arrependimentos
True Diablair
Tipo: Conto ou Crônica
Postado: 06/01/18 00:12
Avaliação: Não avaliado
Tempo de Leitura: 4min a 6min
Apreciadores: 3
Comentários: 2
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Palavras: 741
Não recomendado para menores de dezoito anos
Notas de Cabeçalho

Saudações.

Ainda com problemas técnicos/criativos. Todavia, não poderia ignorar a convocação. Não de quem a fez. Perdão pelo trabalho simplório

Dedicado à Garota de Heidelberg (o que quase chega a ser ofensivo, dada a baixa qualidade da obra x qualquer expectativa).

Capítulo Único Arrependimentos

Pasta: Executados

Local: Corredor Leste

Arquivo: D14b0l1c0-13

Descrição: Nota deixada pelo prisioneiro 4kUm4-3x6 (Sado Kiriyama, vulgo Hecatombe de Osaka), que sofreu uma até então inédita decapitação no enforcamento durante o ato de sua execução (a despeito do cumprimento rigoroso dos procedimentos vigentes à tarefa) às 03h00 da data de ontem:

"Saudações.

Uma vez que li meus três livros (a saber: Breviário da Decomposição, Assim Falou Zaratustra e O Livro de Nod) e a lâmpada vermelha em minha cela parou de piscar há algum tempo, decidi deixar minhas considerações finais acerca de toda esta situação. Não por esperar que sejam lidas, compreendidas e/ou aceitas, mas por mero e inócuo passatempo até que venham me levar para a forca.

O ser humano é naturalmente ignorante no que tange ao próprio humano enquanto ser e assim será indefinidamente, pois tem medo de ir além. Mas, veja, na mitologia cristã Lúcifer o fez (mesmo que Ele estivesse acima dos homens e dos próprios anjos). Adão o fez (ainda que sutilmente induzido/seduzido por Eva). Caim? Idem (não por inveja ou ódio, mas para sacrificar a Deus aquilo que mais amava, igual seu irmão fez com a tal ovelha). Então, certa noite de minha até então insuportável mediocridade vital regada a insônia e apatia, decidi basear-me e inspirar-me nestes três personagens e fazer como eles.

Iniciei por mim mesmo, claro: a experimentação de privações, excessos, ferimentos e doenças foi algo... Indescritível. Todavia, tal feito fortaleceu minha carne (e a marcou hedionda e irreversívelmente), calibrou minha mente e refinou meu espírito para o próximo passo, que seria ainda mais extenso e extremo que o primeiro.

Eu igualmente fui além em franca rebelião contra o status quo existencial, abraçando o descobrimento e conhecimento através da dor, do sangue e da morte de outrem. E ao fazê-lo sem nenhuma discriminação de idade, gênero ou espécie nem quaisquer limitações quanto aos métodos e durações dos processos, me dei conta de que a dita "humanidade" de uma pessoa não resiste ou sequer existe de fato a menos que ela permita.

Eu transcendi o Homem que fui ao transgredir o que os demais consideram correto, justo, legal ou mesmo humano. No limiar do suplício e da penúria alheias, através da mutilação, violação, destruição e consumição de cada e todo corpo que vitimei, me tornei um Übermensch legítimo.

Se pudessem sequer chegar perto de mensurar a quantidade e a qualidade de informação e prazer que podem ser obtidos quando não se impõe absolutamente nenhuma barreira a si e aos outros... Todavia, se fosse algo fácil de ser realizado, qualquer um poderia fazê-lo, não é mesmo? Sim, é preciso um grau intenso e imenso de tempo, esforço e determinação para tal avanço. Raros são os que estarão dispostos a trilhar tão árduo percurso.

A verdadeira Grandeza e o advento da Evolução são um destino reservado para poucos, no final das contas.

Aos que vaidosamente se vangloriam e/ou regozijam do fato de eu estar "preso no Corredor da Morte", destes quase sinto dó: tamanha é sua ignorância que beira a inocência! Primeiro, porque todo aquele que nasce neste mundo já está condenado ao mesmo fim que eu, sendo as únicas diferenças o local do cárcere, a hora da morte e o modo como se dará a sua pena capital. Segundo, os que não tem motivos para estar aqui são os mais miseráveis dos cativos, pois estão presos às suas deploráveis limitações morais e éticas, fenecendo na ignorância de si mesmos. Não existem em inquestionável plenitude; são como fetos malfeitos cujo mundo se resume ao útero de suas malditas mães.

Por fim... Ainda resta um último aprendizado a ser obtido com os humanos, o corolário da epifania: eu devo experimentar o assassinato in loco, vivenciá-lo em mim mesmo, transpondo assim o mais indescritível dos tabus. Por isso me deixei ser pego: suicídio não seria adequado, há a necessidade de uma execução por uma mão que não a minha.

Sacrifício: o findar da barrareira. O pináculo da Sabedoria acerca de si e em si mesmo. E tudo isso nos leva para este fim. O meu fim, ao qual aceito e anseio com o maior e mais sincero dos sorrisos, pois triunfarei ao término da jornada.

Ouço passos do lado de fora. Hora de ir.

E antes que questionem, sim, eu me arrependo. De duas coisas, somente: não ter feito todas aquelas coisas com mais gente e animais nem de ter começado tudo aquilo bem antes...

Sem mais,

Sado."

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Apreciadores (3)
Comentários (2)
Postado 06/01/18 01:04

A pessoa me aparece do nada, mas vem com uma outra cheia de tudo. Agora é oficial: definitivamente irei perder o desafio.

Que obra estupenda! Fui tomada por muitas reflexões e absorvi muitas palavras que chegaram até mim como um puta tapa na cara. Me senti na pele deste condenado e pude compreender com perfeição seu ponto de vista mais do que real sobre a vida e a morte.

Meus parabéns, meu estimado amigo!

Postado 06/01/18 01:10

Ah, Srta Ternura... Sempre tão gentil e fraternal comigo... Enaltecida verdadeiramente se encontra minha alma por tamanhos elogios! Ganhei a noite!

Mas, acredito muito mais no potencial da senhorita do que no meu próprio, logo aguardarei ansioso pela sua postagem!

Gratíssimo, de todo o meu maldito e atrofiado coração! Gratíssimo! E desejo-lhe a melhor das fortunas neste excelso Desafio!

Postado 10/01/18 15:27 Editado 10/01/18 15:28

Uma carta digna dos Insanos... Saudades daquele ser que sempre nos apresenta bons casos. e_e

É um ótimo texto. Parabéns e boa sorte!

Postado 12/01/18 22:34

Pois é... Por muito pouco não tornei esta obra parte do Diário...

Gratíssimo!