Se passaram tantas primaveras, e hoje desfruto de mais uma primavera...
Acordo cedo, ouvindo os passarinhos cantarem em nossa janela. Olho para o lado da cama de casal e vejo que alguém não está. Certamente está tomando ou preparando o café antes de ir trabalhar. Levanto-me como todos os dias, tomo um banho morno e confortante, visto uma camiseta dele — que agora é minha. Sempre tive o costume de roubar as camisetas do meu esposo. Você aí, leitor, não me julgue.
Vou para a cozinha arejada. O sol entra iluminando todo o chão, as paredes e as cortinas curtinhas, amareladas e cheias de florzinhas. Fazia um dia lindo lá fora, mas nada era mais belo do que a cena que eu via agora: meu esposo amado, com a camiseta de serviço, a barba por fazer que eu tanto gostava, mas que ele insistia em tirar. Os anos passaram para ele, havia fios brancos aqui e ali em seus cabelos, porém isso só lhe dava mais charme. Os olhos, porém, eram os mesmos de dez anos atrás: lindos e penetrantes.
Meu esposo me olha, percebe que estou fitando-o sem parar e não deixa de sorrir, dizendo:
— Não vai sentar para comer, não?
Eu apenas sorrio, concordo com a cabeça, sem jeito. Sempre ficava sem graça diante daquele sorriso. Nós dois comemos juntos um desjejum simples: pão com geleia ou margarina, suco de laranja (ou de outra fruta) e aquele café bem passadinho. Coisas simples que apenas pessoas simples veem o devido valor e conseguem apreciar.
Terminado o café, lavo rápido os copos, guardo tudo, tiro a mesa, sacudo a toalha com os farelos de pão lá no jardim...
Ah, o jardim! O lugar mais lindo do mundo depois da minha humilde casa. Era um terreno grande e reto, com um gramado verde-vivo, esvoaçante, que ao passar deixava nos pés o frescor dos orvalhos gelados. Mais à frente, um ipê amarelo florido — uma árvore linda que trazia para nós sua alegria e cores vibrantes. Em volta dela, milhares de flores caídas, parecia até sonho. E, pendurado nessa mesma árvore, um balanço caseiro feito pelo meu esposo para o nosso filho.
Eu estava tão boba olhando nosso jardim que até esqueci de dizer a você, leitor: bem, eu e meu esposo temos um filho chamado Régulus. Sim, o nome foi ideia dele também. É o nome de uma estrela. Meu esposo, Lu, é meio doidinho, mas fazer o quê? Eu me apaixonei e agora é tarde demais.
Nosso filho tem oito anos e está na escola. Meu esposo é um bom pai, um tanto rígido e meio carrancudo com crianças, mas ainda assim excelente: sempre ensinando o melhor. Bem, olhando para o balanço aos pés do ipê, consigo imaginar meu esposo, eu e nosso filho ali: eu sentada no gramado, entre as pétalas de flor, e meu amado brincando com nosso menino, falando coisas de homem, papo de garoto para garoto, enquanto os sabiás cantam à nossa volta e o sol se põe.
Ainda com a toalha da mesa em mãos, perdida nesses pensamentos lindos, sinto uma mão em meu ombro que me faz despertar. Era Lu. Ele me abraça de lado, sem dizer muito, e passa a observar tudo aquilo: nossa casa, nosso terreno, nossas árvores e flores. Não deixo de sussurrar:
— Eu estou tão feliz...
Ele nada responde. Era assim mesmo, tinha dificuldade com palavras. Apenas me beija no rosto e aperta mais o abraço. Só depois de um tempo diz, em tom baixo:
— Obrigado por me fazer feliz.
Eu o olho, viro-me e o beijo delicadamente nos lábios. Ele então dá apenas um sorriso bobo — um sorriso que só dá para mim. Pega sua mochila de trabalho, entra na garagem ao lado da casa, liga o carro e parte. Mas, antes de sumir na distância, ainda consigo vê-lo mandar um beijo e um “tchau” para mim pelo vidro.
Volto para a cozinha, coloco a toalha de mesa em seu lugar e simplesmente recomeço minha rotina. Logo meu filho e meu esposo chegarão para o almoço. Quem sabe hoje não sairemos para jantar fora ou pediremos pizza para comer enquanto assistimos a um desenho animado?
Quem vê, principalmente você, leitor, pode pensar que minha rotina é chata, cansativa, enjoativa. Mas você não sabe: para mim, cada dia é uma aventura ao lado dos que amo. Batalhei tanto nesses últimos dez anos para que nós dois — eu e Lu, e agora Régulus — tivéssemos a vida que merecíamos ter.
Todos os meus sonhos foram realizados: namorei com meu atual marido aos dezenove, terminei a faculdade aos vinte, casei-me aos vinte e dois e tive meu filho aos vinte e quatro.
E agora, aos trinta e poucos, sou perfeitamente e completamente feliz.
Na manhã seguinte, em um sábado ensolarado, vejo o mesmo jardim e o mesmo ipê. Vejo também meus maiores tesouros conversando perto do balanço. Não deixo de sorrir, indo até eles para fazer companhia.
E o pensamento que me vem à mente é sempre o mesmo:
Estou finalmente feliz. Estou bem.