A Culpa Não É Minha
True Diablair
Tipo: Conto ou Crônica
Postado: 10/08/20 00:15
Editado: 10/08/20 05:44
Avaliação: 10
Tempo de Leitura: 1min a 2min
Apreciadores: 7
Comentários: 5
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Palavras: 295
[Texto Divulgado] "O Jarro De Carne" O recém formado doutor Haward, inicia sua jornada de trabalho ao lado de seu mentor. Juntamente com sua equipe, ele inicia um experimento que mudara, para sempre, o futuro da humanidade.
Não recomendado para menores de dezoito anos
Notas de Cabeçalho

Atenção: o conteúdo desta obra é, por definição, imensamente polêmico, perturbador e chocante. Leia por sua conta e risco.

Alerto também que o autor não faz quaisquer apologias ao(s) tema(s) e acontecimento(s) aqui retratado(s).

Capítulo Único A Culpa Não É Minha

"Não há mais saída...

Faz dias que mal saio do meu quarto. Não há fome. Nem sede. Nem lágrimas. Mal reconheço a mim mesma ou este local ao encarar o espelho. Antes, com todo esse azul e decoração radiante, aqui era meu refúgio. Agora, só parece um bom lugar para despertar desse pesadelo sem fim.

As imagens e sensações ficam se repetindo feito um trailer do Inferno na minha cabeça, sabe? E a cada vez que isso acontece, me sinto mais imunda, enojada, humilhada, desesperada, perdida. É uma dor que nunca vai caber dentro de mim e isso me destrói além de qualquer explicação ou crise de choro. Aquele cara não tinha... Ninguém tem o direito de fazer essa monstruosidade com alguém! Ele destruiu minha vida de uma forma impossível de reverter!

Eu não aguento mais... EU NÃO AGUENTO... MAIS...!

E agora que a história se espalhou, ainda tem pessoas querendo fazer com que eu me sinta culpada pelo que aconteceu, como se eu tivesse de algum modo induzido ele a... Pelo amor de Deus, que diabo de racicínio doentio é esse?! A culpa não foi minha, nem de onde eu estava, nem do que eu vestia!

O estuprador é ele! ELE!

Só que quem vai morrer sou eu. Se bem que já estou morta por dentro desde aquele maldito dia e parece que o mundo nunca vai parar de me enterrar.

Eu não aguento mais...

Me perdoa mãe. Me perdoa, pai. Me perdoa, maninho.

Amo vocês. Pra sempre."

***

Horas depois, ao arrombar a porta do quarto da jovem, o pai dela encontrou o cadáver da filha sentado no chão em meio à uma grande poça de sangue oriundo dos braços severamente retalhados. A carta de despedida estava colada na parede onde jazia o corpo.

❖❖❖
Notas de Rodapé

Esta obra infelizmente foi baseado na trágica história real de Antonia Barra, uma jovem chilena que foi violentada, teve o caso exposto nas redes sociais pelo ex-namorado a quem buscou procurando apoio e terminou por se suicidar em Agosto de 2019.

As frases em negrito+itálico e negrito+sublinhado fazem menção direta às ditas em protestos anti estupro no Chile e no mundo que voltaram a ocorrer por conta do modo como o juiz responsável pelo caso estava querendo lidar com o criminoso (atualmente preso).

Não existe nada pior que o Terror/Horror da vida/do mundo real. Nada.

Apreciadores (7)
Comentários (5)
Comentário Favorito
Postado 10/08/20 00:46

Como uma sobrevivente de estupro e abuso, sei que esse texto é real demais.

Por um tempo você finge que não aconteceu, você pensa que está maluca, afinal, o cada trata todo mundo tão bem, né?

Por qual razão iria fazer uma coisa dessas com você? A sangue frio?

Diab, só quem passou por isso, sabe como é real, e DÓI ESCANCARANDO O PEITO, ver todo dia nas notícias uma menina (geralmente), que não pôde suportar o que aconteceu, dói demais e nos mata de novo, cada vez que parece que o esturador ganhou mais uma vez...

Não tem nada mais terrível do que a realidade.

Sua obra foi pontual, certeira.

Espero que a Antônia esteja em um lugar melhor e sem mais dor.

Obrigada por compartilhar! Parabéns por esta obra (infelizmente) perfeita!

E QUE BOM QUE VOCÊ VOLTOU MEU CHAPA!!!

Postado 10/08/20 00:54

Huldra, eu... Realmente estou sem chão aqui e agora...

Suas palavras foram como um golpe de punhal no mais profundo da alma que silencia qualquer tentativa de resposta por conta do peso e do choque...

Eu sinto muito. Sinto muito com toda a sinceridade de meu ser.

E muito, muito obrigado por estar não só aqui, mas também por fazer parte uma vez mais de minha existência.

Você é preciosa demais para este mundo.

Postado 10/08/20 14:17

Meu Deus, seu texto é muito profundo, me pegou muito a emoção horrível e a tristeza enorme... O estupro é sempre um ato tão horrível... Eu não tenho nem palavras agora, fiquei sem chão mesmo, vc escreve muito bem, soube colocar toda a carga sentimental muito bem, e chegou no fundo do meu coração...

Postado 10/08/20 15:50

Srta Vilma, é sempre uma satisfação receber um feedback dessa magnitude, ainda mais se tratando de assuntos tão hediondos como os aqui mostrados. Só lamento por tudo ser baseado na mais funesta e ainda constante realidade...

Muitíssimo obrigado pela presença, review e elogios! Gratíssimo!

Postado 10/08/20 19:20

Por todos os diabos!

Como tecer um comentário digno dessa obra??

Diablair... Você escreveu maravilhosamente bem sobre esse tema tão horrivelmente hediondo! O senhor é um escritor incrível, estupendo demais.

Certa vez, me causa até mal estar só de lembrar, eu escapei de uma situação que poderia ter acabado em tragédia. Foi por um triz que consegui sair ilesa, e mesmo assim já me sinto horrível de lembrar o ocorrido. Por isso não consigo nem imaginar o tamanho da dor que alguém que não conseguiu escapar sente...

A pessoa que faz isso com outra, é com toda certeza a mais vil e suja das criaturas, completamente desprezível... O "quase" já me faz ter pesadelos recorrentes, então só imagino o pesadelo vivo que as vítimas verdadeiras sofrem e vivem todos os dias ao se recordarem da violência...

O seu texto merece todos os aplausos, você deu uma puta cacetada, muito necessária sobre esse tema. A culpa que cai sobre a vítima é a pior doença dessa sociedade monstruosa em que vivemos... Obrigada por mostrar isso em seu texto. Essa culpa termina por matar as vítimas, que em sua maioria já estão mortas por dentro.

Minha alma está em profunda dor por essa menina sobre quem você escreveu... E também em profunda dor ao pensar em todas as vítimas dessa violência, sejam elas do sexo feminino ou masculino...

Eu reverencio o grande escritor que o senhor é!!!

Postado 11/08/20 00:06

Por Satã, eu quem me pergunto como responder um comentário dessa magnitude, Srta Yukari...

Esse assunto é de uma monstruosidade sem tamanho e fico imensuravelmente feliz que não tenha sido vitimada por esse evento hediondo e muito agradecido pelas suas palavras acerca desta obra tão polêmica e pesada.

Muitíssimo obrigado, de todo o meu escabroso e surpreendido coração!

Postado 12/08/20 21:47

Eu vi algumas coisas sobre o caso, na época e... Moço, não tenho nem palavras suficientes para fazer um comentário que seja aceitável. Eu só queria/só posso dizer que estou completamente no chão agora.

É uma obra e tanto, moço!

Postado 12/08/20 22:09

Moça, fazer uma leitora e mulher como você ficar assim após ler um texto é uma das maiores recompensas que um autor poderia receber!

Muitíssimo obrigado, de todo o meu inerte e apodrecido coração!

Postado 12/08/20 22:58 Editado 12/08/20 23:00

O fato de ser mulher e habitar o mundo são dois fatores perigosos. Nós somos como presas procuradas por caçadores, vulgo homens. A culpa é de tudo e da própria vítima, nunca do assediador/estuprador. Meninas são criadas para serem fragéis. Meninos são criados para serem selvagens.

Gostaria muito de dizer que não sei identificar alguns dos sentimentos retratados nestas linhas, mas, infelizmente, eu sei. Esse sentimento de imundice, de violação, de uma culpa que não te pertence. Tudo isso me veio a mente quando fui assediada pela primeira vez, na escola, por um colega de classe. Eu tinha 6 anos. Não fazia ideia do que se tratava ou do porquê ele fazia aquelas coisas comigo. Só me lembro de contar para os meus pais que me sentia muito suja e por isso precisava tomar banho, até aquela sensação de podridão passar. Eu nunca vou esquecer o horror nas lágrimas da minha mãe e do ódio nos gritos do meu pai. Felizmente, eles nunca me culparam. Mas o amor não nos poupa do assédio e eu perdi a conta de quantas vezes isso aconteceu em público e ninguém me ajudou.

Não consigo nem imaginar como seja vivenciar esse ato horrendo, digno de nojo, que é o estupro, apesar de ter escapado de várias situações que poderiam ter terminado dessa forma. Nós temos que quebrar essa cultura escrota do estupro que é enraizada desde a infância. As mulheres precisam ser ouvidas, protegidas, acreditadas... porque não há amor no mundo que cure uma cicatriz dessas na alma. Nada justifica um ato desse, nada.

Seu texto é, por todas as perspectivas, necessário. Afinal, nós temos um homem retratando algo vivido por muitas mulheres. Com uma narrativa embargada de realidade, cada palavra é dolorosamente dolorosa e cada sentimento é verídico. A gente lê e automaticamente sente essa dor...

Obrigada por compartilhar esse texto conosco, Diab. Ele é importante, fundamental e necessário. Nós precisamos de mulheres engajadas na luta feminista, mas precisamos, também, de homens que entendam que as pautas não são frescura e mimi.

Meu coração está sangrando com esse texto e talvez fique assim eternamente.

Obrigada, Diab, mil vezes ♥

Postado 13/08/20 07:24

Srta Ternura (ou talvez Tristeza momentaneamente, dada a lembraça do fato escabroso), seu comentário foi um golpe na alma e um tapa de alerta em nossos rostos. Eu fico muito consternado ao tentar imaginar algo assim acontecendo com uma mulher tão afável e especial quanto você, muito embora ninguém mereça por algo assim jamais, por qualquer que seja o motivo. Eu sinto muito, de todo o meu coração obscuro...

Me faltam palavras para expressar meu contentamento por ter recebido comentários tão preciosos e corajosos como os da senhorita.

Muitíssimo obrigado! Gratíssimo!