Medusa nascera bela, distinta entre as filhas de Fórcis e Ceto. Enquanto suas irmãs imortais carregavam a eternidade nos olhos, ela trazia a fragilidade da mortalidade. Devota de Atena, servia como sacerdotisa, sonhando com o celibato. Mas sua beleza, inevitável e perigosa, atraiu Poseidon. No templo da deusa, a violência se consumou. Atena, tomada pela fúria, não puniu o agressor, mas a jovem: transformou-lhe os cabelos em serpentes e o olhar em maldição.
Exilada, Medusa tornou-se símbolo de medo e poder. Perseu, enviado para matá-la, usou um escudo polido como espelho e a decapitou enquanto dormia. Do sangue derramado nasceram Pégaso e Crisaor. A cabeça, ainda carregada de poder, foi entregue a Atena, que a fixou em seu escudo.
Mais que um monstro, Medusa tornou-se a lembrança viva de uma vítima transformada em ameaça. Sua tragédia misturava injustiça, força e vingança divina.
A noite estava pesada. O vento soprava como se trouxesse segredos antigos. Yohan caminhava ao lado de Josefine por um bosque esquecido, onde as árvores se inclinavam como testemunhas silenciosas. Entre raízes retorcidas e pedras cobertas de musgo, algo brilhou: um reflexo metálico, quase um chamado.
Josefine se aproximou primeiro. Ali, envolta em um véu de poeira e tempo, repousava a cabeça de Medusa. As serpentes, mesmo mortas, pareciam se mover em um sussurro eterno. Os olhos fechados guardavam a ameaça de um poder que jamais se extinguiu.
— Yohan… você sente isso? — murmurou Josefine, a voz trêmula. — É como se o ar pesasse. Como se ela ainda estivesse viva — respondeu ele, sem conseguir desviar o olhar.
O silêncio se tornou denso. Não era apenas uma relíquia; era um fardo. A cabeça de Medusa não era objeto de contemplação, mas de escolha. Carregava em si a dor de uma vítima e a fúria de um monstro. Agora, diante deles, parecia exigir destino.
Josefine estendeu a mão, hesitante. Yohan a segurou, firme. — Se tocarmos, não haverá volta. — Talvez seja justamente isso que precisamos… — respondeu ela, com um brilho de coragem nos olhos.
Naquele instante, o bosque pareceu prender a respiração. As folhas não se moviam, os animais silenciaram, e até o vento cessou, como se o mundo aguardasse a decisão.
Josefine respirou fundo, o olhar fixo na cabeça. As serpentes imóveis pareciam despertar em sua presença, como se reconhecessem uma nova guardiã. — Yohan… eu sinto que ela me escolheu. — Escolheu? — ele retrucou, a voz carregada de incredulidade. — Isso não é escolha, é condenação.
Ao tocar a superfície fria e áspera, Josefine sentiu uma vibração percorrer-lhe o corpo. Não era apenas medo; era poder. Um sussurro ecoou em sua mente, como se a própria Medusa falasse através do tempo. — Você não entende… — disse Josefine, com lágrimas nos olhos. — Ela não é só um monstro. É dor, é injustiça. E agora… é minha responsabilidade.
Yohan hesitou. O peso daquilo o esmagava, mas ao ver a firmeza no olhar da irmã, percebeu que não havia retorno.
No instante em que Josefine tocou a cabeça, o bosque se iluminou com uma energia sombria. As sombras se moveram, as árvores estremeceram, e o silêncio foi quebrado por um rugido distante. A maldição da górgona não estava morta. Estava apenas esperando.
A cabeça começou a irradiar uma energia antiga. O espírito de Medusa despertou e tomou Josefine. Em um instante, ela deixou de ser apenas humana. Seus cabelos se tornaram serpentes vivas, e sua pele adquiriu o brilho sombrio da maldição. A górgona havia renascido.
Yohan recuou, o coração disparado. O medo o paralisava, mas ainda havia esperança em sua voz. — Josefine… irmã… lute contra isso. Você não é ela.
Os olhos da nova Medusa se abriram, cintilando como lâminas. As serpentes se agitaram, sibilando em coro. O silêncio do bosque foi quebrado por um poder que não admitia resistência. — Não há volta, Yohan — sua voz ecoou, grave, como se fosse a própria Medusa falando através dela.
Ele tentou se aproximar, mas o olhar petrificante o alcançou. Num instante, seu corpo endureceu, transformando-se em mármore frio. A estátua de Yohan permaneceu ali, imóvel, como testemunha eterna da tragédia.
Josefine, agora Medusa, ergueu o rosto ao céu. O vento voltou a soprar, carregando o som das serpentes que se entrelaçavam em sua cabeça. A górgona estava viva novamente, e o mundo, mais uma vez, seria marcado por sua maldição.

