O Menino
Holzwarth
Tipo: Conto ou Crônica
Postado: 22/08/24 12:26
Editado: 22/08/24 12:35
Gênero(s): Suspense
Avaliação: Não avaliado
Tempo de Leitura: 3min a 5min
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Palavras: 637
Não recomendado para menores de dez anos
Notas de Cabeçalho

pesadelo

Capítulo Único O Menino

Quando se tem uma casa de madeira, em cujas paredes escalam grossas rachaduras, o que há em seus jardins? Lá florescem flores magras e secas, pois à sombra do beiral os pés de tomate são sufocados — querem ver o sol e o que existe atrás das nuvens. Se céu ou Paraíso, não sabem, mas continuam a crescer. Quando se tem uma casa de madeira, cultiva-se limões no quintal, junto ao muro cinza, que de pouco em pouco ficou amarelo para enganar o outro que vê de fora. As aranhas repousam pelos caibros. A casa de madeira range. Não chegou a hora ainda.

As três mulheres sobem a escada, o que sobra no fundo é o leão — amarelo — que, mudo, aguarda ser convidado.

— Venha! Suba! — dizem, e a pequena criatura rasteja degraus acima.

Ali, não é nada, apenas quem vê a tarde ao redor — cinza — e o dia estalar — branco — em meio ao pretume da noite no horizonte. O sol se recolhe atrás do oceano, pede-lhe abrigo e pergunta-lhe o porquê de tudo estar sempre tão gelado, mesmo depois de raios tão quentes. Os prédios pálidos, as ruas retas, o mar espumoso, a casa quieta. Quando se tem uma casa de madeira, espera-se que esteja fumegando ao fim do dia, então por que não há calor no telhado? A costa nada diz, afinal as trincas em sua orla não são como aquelas nas telhas da casa de madeira. Não chegou a hora ainda.

Sobem os quatro e, à esquerda, há um quarto fechado. Depois, outro. Atrás, ao se virarem, outro, mas aberto e tão branco quanto os outros. Quando se tem uma casa de madeira, as vigas são castanhas, porém no quarto aberto são da cor do dia que se encolhe. Os brinquedos ainda estão no chão, assim como as peças coloridas, a caixa transparente, o tapete de borracha, mas não chegou a hora ainda.

— O menino não está aqui ainda — diz uma.

Quando estivesse tarde, o menino chegaria. Ia dar tempo, ia dar tempo. Ia dar tempo de o menino chegar. Quando se tem uma casa de madeira, espera-se pelo menino no quarto azul. Uma delas disse. Outras disseram. O menino no quarto azul dentro da casa de madeira com rachaduras pelas paredes e um jardim de tomates e aranhas nos caibros. A hora vai chegar. Alegre-se.

O leão amarelo logo veria o menino que o perdera na areia, mas ao pensar no reencontro, seu coração enchia-se de pavor. A noite traçou pelas costas dos morros um longo arrepio e se deitou sobre a casa de madeira ao som dos urros do mar.

— O menino está vindo — diz a terceira, e entra no quarto escuro — azul —, e para a pequena criatura sobra o medo. A mulher desbrava a escuridão e vai até o centro. O breu a fita detrás das janelas. As outras aguardam no corredor.

— O menino está vindo. Fale baixo — diz ao leão amarelo — e venha devagar para não assustá-lo.

Ali está, no quarto azul. Quando se tem uma casa de madeira, espera-se pelo colapso inevitável do tempo: a umidade corrói suas paredes, infiltra, abre buracos, detona o telhado junto ao granizo implacável caído do céu. E o que fez para merecer está na juba do leão, parado no meio do quarto, pois o menino estava bem ali. Chegou a hora.

— O menino está aqui — E todas se calam.

Era o menino. O menino chorando na orla, na costa, na areia, no parquinho, no quarto, debaixo da mesa, entre os tomates, sob o limoeiro, longe do sol. Criatura chorona. Criatura amarela e pequena e chorona, em cuja mão — pequena — tem um leão como ele. Alegre-se, o menino está aqui! Alegre-se: ele chegou! Mas fale baixo, leãozinho, pois ele tem medo do escuro, e quando se tem uma casa de madeira, todas as luzes ficam apagadas.

❖❖❖
Notas de Rodapé

very scary.

também no site do fogo.

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