Sequestradora de palavras
Cria de Minerva
Tipo: Lírico
Postado: 16/10/24 21:37
Gênero(s): Poema
Avaliação: Não avaliado
Tempo de Leitura: 3min a 4min
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Palavras: 519
Livre para todos os públicos
Capítulo Único Sequestradora de palavras

Quando me perguntavam o que eu seria quando crescesse, minha respostava estava na ponta da língua: sequestradora de palavras. Os adultos riam e faziam piadas, de acordo com eles isso não existia. Ora, como não? Todos os dias, quando acordamos, sequestramos palavras, às vezes até as devolvemos apenas para dar lugar à outras. Observe esse diálogo que tive pela manhã com o síndico do meu prédio:

- Bom dia, senhor!

- Bom dia, senhora.

- Como vai?

- Estupendo!

Percebe? Eu ofereci palavras para este homem, apenas para sequestrar as dele. “Estupendo”! Veja só, que achado incrível. Cresci e dediquei minha vida ao meu trabalho, em todas as esquinas, padarias, escolas e armazéns, eu sequestrava palavras. Anotava cada uma em meu caderno para imaginar que combinações perfeitas elas fariam. O que eu ganho com isso? Oh, a maior riqueza que eu poderia desejar! Sou paga com sorrisos, abraços e momentos felizes. As palavras representam pra mim algo que não consigo fazer sozinha... ser eu mesma. Todas as vezes me sinto errada, torta, desajeitada. Parece que todos os passos que dou, são observados e criticados. E, mesmo com as palavras, sinto que desperdicei algumas, demorei tanto tempo para sequestra-las e conseguir ornamentar cada uma delas com outras palavras, até formar poemas, contos e poesias. E, mesmo que – para mim isso seja a maior demonstração de amor que meu coração consegue expor – algumas vezes, elas não são apreciadas. Desde criança, zombavam da minha profissão, zombavam que eu pudesse sequestrar palavras e, quando eu tentava expor como elas eram belas, eram completamente ignoradas. E isso não mudou ao decorrer do que cresci, na verdade, na adolescência foi pior. Eu passava horas sequestrando as palavras mais interessantes que encontrei, passava horas organizando cada uma delas para que parecessem um jardim sonoro. Mas quando convidava as pessoas para entrar, pela empolgação delas, parecia que eu estava convidando-as para uma palestra dolorosa que ninguém queria ouvir. Até hoje me dedico ao meu trabalho, sequestro palavras. Contudo, nos dias de hoje, eu as devolvo apenas para quem deseja e aprecia. As vezes as pessoas não entendem que, para mim, todas as palavras que sequestro e organizo, tem a produção final no amago do meu ser. Cada palavra passa por um processo de refinamento, são milimetricamente lapidadas para serem entregues com perfeição para aqueles que amo. Não consigo expor e dividir palavras assim, por dividir, todas que saem de mim são pensadas e moldadas pelo amor e finalizadas com o carinho do meu coração. Eu entendo, nesse ramo de palavras algumas pessoas costumam utilizá-las de qualquer jeito, mas acho que me destaco em meio aos concorrentes por isso. Todas as minhas palavras são concretizadas e ganham vida após tempos e tempos de gestação, elas passeiam pelo meu sangue, caminham pelas minhas artérias e terminam de ser lapidadas pelo meu coração. Quando as proclamo, elas caminham pelo vento já direcionadas ao coração que tanto quero bem. Hoje, acho que mesmo com meu estoque eterno e infinito de palavras, nenhuma delas, mesmo que organizadas enfileiradamente, em poema, música, texto ou prosa, serão capazes de lapidar tudo que meu coração tem vontade de gritar.

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