A Noite da Canção Derradeira
True Diablair
Tipo: Lírico
Postado: 30/12/16 05:20
Editado: 30/12/16 06:50
Avaliação: Não avaliado
Tempo de Leitura: 3min a 5min
Apreciadores: 5
Comentários: 3
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Palavras: 635
Livre para todos os públicos
Notas de Cabeçalho

Nada como um épico para encerramentos, não é mesmo?

Espero que apreciem a leitura...

Capítulo Único A Noite da Canção Derradeira

Sente: vou lhe contar uma história

Muito real, ainda que assombrosa,

Sobre uma pessoa que deu o seu melhor

Mesmo quando julgaram-na como a pior.

Diziam que não prestava para nada

Que sua existência era uma piada

Que não tinha o menor talento

Que tocar era pura perda de tempo

Que tentasse uma carreira "de verdade"

Antes que fosse demasiado tarde.

Fora isso, o resto sempre foi uma bosta

Em casa, na rua ou na escola.

Somente na música encontrava algum alento,

Ainda que seu progresso fosse muito lento.

Houve uma época tão, mas tão fodida

Que cogitou a dar um fim à própria vida.

Família zoada, sem amigos, sem futuro,

Sentindo que vivia a esmo no mundo.

Algo a compelia a insistir, todavia.

Exatamente o quê, não sabia.

Somente sentia que a resposta estava na paleta,

Na guitarra, nas caixas e na pedaleira.

Buscava a todo custo manter seu objetivo,

Mesmo sem ninguém para lhe dar incentivo.

A coisa toda piorou até o ponto

Em que chegou a duvidar de seu próprio sonho

Ou da validade de sua estadia

Em um mundo/sociedade que lhe destruía.

Com o âmago mais que despedaçado,

Montou todo o equipamento no telhado

Decidindo externar tudo o que retera até então

Em uma derradeira e tresloucada criação.

Foi numa madrugada, a mais soturna,

Que seria composta aquela música.

A data? Em meu íntimo relembro:

A última noite de um deprimente Dezembro

Não existia letra, somente melodia

Oriunda da guitarra em profunda epifania.

O dedilhar melancólico ganhou a noite

Nota após nota, cada qual feito açoite

Auto-infligido à sua própria alma

Para que a dor saísse e inspirasse de volta.

O ar ficou carregado de tristeza

Conforme a canção adquiria mais e mais beleza;

A intensidade sonora foi se elevando

Memórias e lágrimas se acumulando

Nos olhos cujas íris estavam opacas

Devido às omissões, perdas, calúnias e falhas...

Quão louca e ferozmente tocava

Exprimindo desespero pela sofrível jornada!

Os braços já davam sinais de cansaço:

Tremiam, doíam, estavam um bagaço.

O suor pingava pelo rosto aflito;

Estava difícil para manter o ritmo.

Os dedos começaram a sangrar,

Não mais que as feridas no coração a carregar.

Continuou, mais e mais veloz,

O soluçar fazendo as vezes da voz.

Esfolamento profundo, excruciante

Como o desprezo e a solidão incessantes.

Como cada uma das zombarias.

Como todo o vazio, dia após dia...!

Todo aquela extensão de sentimentos,

Sobrepondo-se ao rigor dos ferimentos:

Alma depositada de modo pleno

Na música de acordes sangrentos .

O choro da guitarra ecoava longínquo,

Instilando pesar a cada ser o ouvindo.

Sentia que algo a mais estava para acontecer

Na medida em que seus tendões pareciam romper.

"PARA! NÃO DÁ MAIS!", o corpo implorava.

Ignorava, se machucava... Tocava, tocava, TOCAVA!

Então, quando o solo atingiu seu apogeu,

Algo sem quaisquer precedentes ocorreu:

Música e artista ultrapassaram os limites

Do que cogitamos natural e do que existe

E naquele instante de angústia máxima,

Cada ser vivo a seu modo expeliu uma lágrima

Tocados por uma lamúria coletiva

Inexplicável, insuportável, desmedida.

O término da canção foi abrupto

Pois quem a tocava sofrera um mal súbito:

Funesto e justificável pagamento

Por tamanha performance sob o firmamento...

Dessa parte não tenho certeza, reconheço.

Mas gosto dela, então conto assim mesmo:

Dizem que na medida em que tudo findava

E a Morte sua alma lentamente levava,

Para seu orgulho acabou descobrindo

Que, ao contrário do resto, Ela estava sorrindo...

Acredite se quiser: esta é a história verdadeira

Por trás da Noite da Canção Derradeira.

E se não lhe servir de prova do evento

Junto com essa foto do local do sepultamento,

Ali estão a guitarra com sangue e o resto do equipamento.

Vamos, toque! Dê tudo de si, sem refreamento!

Se tiver a vontade e o comprometimento,

Quem sabe você também, por um momento...?

❖❖❖
Notas de Rodapé

Honraria, contentamento e gratidão. Nada mais cabe dizer ou sentir.

Hora de seguir os passos da deusa.

Desejo excelentes festas e um memorável Ano-Novo para todos.

Apreciadores (5)
Comentários (3)
Postado 30/12/16 12:23

Fechou o ano no estilo Wolfgang: "Happy fucking new year".

Muito foda esse poema. Lembro quando li a primeira vez e me arrepiou.

Sem mais. Feliz ano novo!

Postado 25/01/17 00:54

Muito obrigado, Jovem Poder. Igualmente...

Postado 02/01/17 11:13

Bom dia, Diab!

Caramba, que poema mais intenso. Aquele típico texto que conta uma história na qual o leitor se adentra nela e vive junto cada momento narrado. Eu juro que vi o músico, do qual todos desacreditavam, subindo no telhado, numa noite gelada e de nevasca, e instalando os instrumentos. Também vi, mas de forma errônea, ele cantando uma música feliz, na qual todos viriam o quanto bom ele era (seria meio clichê e nada a ver com teus textos, mas se tivesse seguido esse rumo, a história me agradaria igualmente). Vê-lo padecer me encheu o coração de pesar. Que droga!

Diab, história muito bacana. Eu curti! Obrigado por uma leitura tão intensa já no começo de 2017!

Parabéns e até mais!

Postado 25/01/17 00:54

Muito obrigado, monsieur LEcrivain...

Postado 05/05/17 15:01

Nada como ler os textos do moço! Eu ia desejar feliz ano novo e tals, mas um já passou e o outro ainda está muito longe, né? '-'

Postado 05/05/17 23:04

Nada como ler os comentários da Moça!

Melhor a senhorita desejar logo..m vai que eu morro antes.

Gratíssimo! Gratíssimo!

Postado 05/05/17 23:31

Você está proibido de morrer. Quer dizer, eu já te matei tantas vezes, a Pam também... Até a Julih já te matou e você não morreu, então... Tá proibido! u-u

Postado 06/05/17 19:48

Sou rebelde. Vou morrer sim. Abraços.

Postado 06/05/17 23:18

Isso é o que veremos! ¬¬

Postado 07/05/17 03:30

Moça, a senhorita percebeu o quanto isso está sendo bizarro? Olha só quem está me proibindo de morrer!

Postado 07/05/17 12:00

Pensei que isso fosse normal para pessoas como nós. '-'

Postado 07/05/17 17:05

O normal seria a senhorita desejar minha morte/me matar.

Postado 08/05/17 12:16

Verdade...

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