Tanto a lua quanto as estrelas no céu admiravam, boquiabertas, a bela obra ainda não terminada, que esperava, paciente, o seu pintor para dar-lhe os últimos toques de vida no dia seguinte. Uma coleção de pincéis repousava ao lado da tela, junto da inseparável paleta de tons veranis escolhidos para pintar, com todo zelo, o gato laranja em cima do cavalete. O animal jovem, da cor do sol que se pusera às seis da tarde, dormia, plácido, enrolado no próprio corpo e na própria cauda comprida.
Era dia quando o pintor chegou para ver seu amigo e cumprimentá-lo com um afago atrás na orelha. O bicho recebeu-o, em cima do cavalete onde dormira, com um piscar lento de seus olhos ambarinos e um longo miado saudoso. Àquela hora da manhã, o gato no cavalete tingia-se de dourado e branco, como os respingos de tinta nas mãos de seu pintor. O sol entrou pela janela para agradar-lhe o pelo brilhoso — com cuidado, beijou-lhe a testa e as orelhas felpudas, para então subir ao topo do céu azul e descer novamente.
O dia se deitava quando o pintor pousou o pincel sobre a paleta manchada de entardecer. Secou o suor do rosto, limpou as mãos no avental, deu carinho ao gato no cavalete, de olhos fechados, adormecido. O toque acordou-o: o bicho miou, olhou em volta; ao ver seu grande presente — o retrato em frente ao qual se deitava —, sorriu. O sol se pusera em sua pelagem cor de laranja, e sob a lua e as estrelas que aplaudiam o jovem pintor, gato e homem admiravam a noite azul, lado-a-lado, presos no para sempre da pintura no cavalete.