Passagem paga, entra no busão, passa o cartão e gira a catraca.
Esse mesmo ritmo todo fim de semana — não que eu esteja reclamando, pois não estou —, mas admito que, às vezes, sair de casa é algo tão perturbador que um simples curso de sábado se torna um sacrifício. Mas vamos que vamos, e novamente encaro com minha mãe aquela fila imensa em frente ao nosso ônibus de volta.
— Que belezura! — digo, ácida. — Vamos sentar aonde? Na cara do motorista?
— Filha, esses são modos? — minha mãe me olha feio e logo encara para frente, fazendo aquela cara murcha de quem pensa o mesmo que eu, mas não admite. — É... teremos que ficar em pé de novo.
— Bem, pelo menos é um dia a mais de vitória e um a menos de aula antes da formatura — sorrio, enquanto vejo a fila diminuir, nos aproximando daquela coisa enorme de quatro rodas.
Entramos finalmente no ônibus, passamos o cartão, giramos a catraca. Torci para aquela porcaria não prender na minha mochila como da última vez. Graças a Deus, não prendeu. Apoiei-me naquelas barras amarelas de apoio do ônibus e fiquei por lá. Minha mãe teve sorte: achou uma colega de anos no mesmo ônibus e começou a papear.
E eu aqui, sozinha, só ouvindo pessoas falando e olhando a paisagem rala que passa pelo vidro enquanto o ônibus anda, parando vez ou outra, até que olho de soslaio para um rapaz — um de cabelo claro. Foco meus olhos nele por alguns segundos. Era bonito, parecia estar entediado também. Fiquei olhando uns dez segundos, encarando praticamente. Sempre fazia isso quase todos os sábados desde que o vi pela primeira vez.
— Ô, filhota! — minha mãe me cutuca com força.
— Hã? — saio dos meus pensamentos e a olho embasbacada. Quanto tempo mais fiquei comendo o rapaz com os olhos? Será que ele ou minha mãe notaram?
— Falta só mais uma cidade para chegarmos. Minha colega já desceu e se despediu, e você nem ouviu ela falar com você. Ficou olhando pela janela o tempo todo... e não apenas a janela, mocinha. — Mamãe dá um risinho doce, mas logo balança a cabeça se fingindo de zangada.
Ô merda, ela notou eu secando o cara. Isso vai dar o que falar!
O rapaz desceu do ônibus, fingi não olhar para ele descendo e resolvi falar com minha mãe sobre coisas aleatórias que costumávamos conversar.
O tempo passou. Após mais paradas e paradas, chegamos à rodoviária da minha cidade. Passei o cartão para sair pela outra catraca e pulei para fora do ônibus, sentindo aquele ar geladinho me revigorar. Eu e minha mãe voltamos para casa: estávamos um trapo!
Tomei banho, coloquei minhas roupas largas, pus a roupa do curso para lavar, me joguei no sofá e peguei o celular. Até que vi: uma mensagem. Era o rapaz!
Na mensagem:
"Oi, tudo bem?"
Respondi que estava tudo bem, e a conversa foi fluindo até que ele soltou:
"Fiquei reparando em você faz uns sábados, e deu a impressão de que você estava fazendo o mesmo comigo, rs"
Sorri. Sorri bobamente. Puta merda, ele me notou. Minha paixonite do ônibus me notou!
Eu estou feliz.
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Sabe lá quanto tempo essa coisa vai durar, só sei que até agora, desde esse dia da mensagem (que já faz um tempinho), sempre conversamos.
Espero que não seja mais uma ponta de faca para me cortar. E, se for, tudo bem: lá se vai uma paixonite boba. Mas até isso acontecer...
Ele será minha paixonite número 1.