Pedro acertou o peito de Manoel em cheio. A voadeira fez com que Manoel não pudesse se quer dar um passo para trás antes de cair. O choque de suas costas tocando o chão foi tão seco quanto o golpe que recebera. No entanto, a dor plena escancarada em seus olhos não impedia que a provocação fosse continuada em palavras por sua boca:
– É isso tudo que tu consegues, Pedro? Cadê tua ferocidade? Cadê tua hombridade?
Somente o gemido de uma dor profunda foi emitido pela boca de Manoel posteriormente tais indagações. Pedro, com os punhos ainda fechados e claramente transtornado, não foi capaz de impedir que a raiva em sua alma o controlasse. O golpe mortal foi disferido antes de a razão interpretar e julgar as consequências do ato que viria. Pedro acertou o pescoço de Manoel em cheio. O chute fatal foi a última dor que Manoel sentiu.
No local, se encontravam os dois. As paredes do velho galpão abandonado foram as únicas testemunhas. Um acerto de contas que não tinha objetivo deixar mensagem alguma. Era um confronto inevitável somente entre os dois.
Pedro estava consciente que a morte de Manoel não mudaria o passado entre os dois, mas Manoel precisava morrer. Pedro, na verdade, era quem queria, mas não podia morrer, pois lhe faltava o que Manoel tinha de sobra: coragem para procurar a própria morte. A alma de Pedro se lamentava por ser tão covarde e reagia estimulando os seus punhos a se fecharem cada vez mais. Pedro sofria.
O sofrimento era consequência de um arrependimento que atordoava Pedro. Nesse momento, ele não queria ter matado Manoel e não queria se lamentar por ser covarde. Seu arrependimento era fruto de tudo que viverá após ter conhecido Manoel. Na verdade, Pedro, se pudesse, teria mudado o seu passado em vez de cometer um assassinato. Não existia explicação lógica para o porquê desse confronto mortal. Mas essas brutalidades só acontecem justamente por não existir lógica. Somente acontecem por existir ódio, rancor, demência. Pedro, ainda de cabeça quente, sob efeitos de um arrependimento esmagador e de sua arrogância característica, procurava por aquilo que não tem como existir.
Sua consciência não mostrava imagens lógicas de seu passado com Manoel. Lógica é uma palavra que nunca se encaixou na história entre os dois. Tudo que ele via nas lembranças que pululavam em sua mente lhe faziam sentir mais dor. Pedro sabia que atordoou Manoel durante a vida toda. No colégio, queimou seus cadernos; na faculdade, cobiçou sua namorada; no trabalho, acabou com sua carreira. Sua consciência o culpava por ter feito Manoel fazer tudo que fez.
Manoel, esvarrido de esperança e repleto pelo desejo vingança, violentou a filha de Pedro. Ademais, arquitetou para que o pai da criança fosse acusado como culpado. Manoel dedicara meses de sua vida somente na elaboração deste plano. Ele queria vingar-se de Pedro e fazê-lo sofrer eternamente, sem ter como escapar da dor e da culpa.
Manoel acertou a alma de Pedro em cheio. O ataque ao psicológico de Pedro o destruiu internamente. Pedro, pela primeira vez, estava na mesma situação triste e desacreditada que Manoel. O confronto físico entre os dois foi uma tentativa desesperada de Pedro se mostrar superior. No entanto, ambos sempre souberam, mesmo antes da troca das agressões, que era em vão. No fundo, o confronto físico somente selou o fim do verdadeiro confronto entre os dois. O confronto espiritual que acabou com as almas de Pedro e Manoel e fez de ambos homens mortos.