O relógio marcava meia-noite. Eduardo despertou com um sobressalto, sentindo o peito apertado e um suor frio escorrendo pela testa. Algo estava errado. O quarto estava mergulhado na escuridão, exceto pelo brilho fraco e inquietante do espelho ao lado da cama. Ele se virou lentamente para encarar seu próprio reflexo — mas a imagem não acompanhou seu movimento.
Na manhã seguinte, seu desaparecimento intrigou a polícia. A porta trancada por dentro, sem sinais de fuga. Nenhum vestígio de luta. Apenas um detalhe inexplicável: o espelho tinha sumido.
O caso caiu nas mãos do detetive Alencar, um homem cético, mas experiente o suficiente para perceber que havia algo... diferente. O quarto de Eduardo exalava um ar pesado, como se o próprio espaço guardasse um segredo. Sua investigação revelou marcas no chão que pareciam queimaduras suaves — como se o vidro do espelho tivesse sido derretido ali.
Nos arquivos antigos da delegacia, encontrou casos semelhantes. Pessoas que desapareceram misteriosamente. Todas tinham um padrão em comum: o espelho que desaparecia junto.
Buscando ajuda, Alencar recorreu a um especialista em fenômenos ocultos, Dr. Hiram, um estudioso de lendas e histórias do além. O velho acadêmico mostrou livros antigos sobre “espelhos-portais”, objetos que não apenas refletiam imagens, mas serviam de passagem entre dois mundos.
— O problema não é o espelho em si — explicou Hiram, com voz grave. — É o que está do outro lado.
Alencar revirou os registros e encontrou anotações perturbadoras sobre entidades aprisionadas em reflexos. Criaturas que esperavam pacientemente alguém vulnerável para poder atravessar. O nome que aparecia repetidamente nos textos era "O
Devoto do Espelho", um ser que, segundo lendas antigas, trocava de lugar com sua vítima, deixando-a presa do outro lado.
Quanto mais Alencar mergulhava no caso, mais sentia que algo o observava. Reflexos pareciam distorcidos à sua volta, e em certas noites ele jurava ver silhuetas dentro dos espelhos. Sua obsessão aumentava, e o perigo crescia com ela.
Na última noite da investigação, sozinho no escritório, folheava um livro sobre entidades do reflexo quando sentiu uma presença atrás de si. Lentamente, virou-se e viu... Eduardo.
No espelho.
O jovem estava ali, pálido, os olhos arregalados, a boca sussurrando algo que Alencar não conseguia compreender. Sua mão batia no vidro do espelho, como alguém tentando fugir de uma cela invisível.
O detetive, arrepiado, tocou a superfície fria do espelho. E, naquele momento, sentiu algo puxá-lo.
O homem ficou aflito, sua cabeça rodou. Seu escritório começou a se tornar gélido, se encheu de sombras, uma neblina densa e reflexos distorcidos.
Do outro lado do espelho, Eduardo gritou:
— Saia antes que seja tarde!
Mas era já era tarde.
No dia seguinte, o espelho no escritório de Alencar desapareceu. E o detetive nunca mais foi visto.