Dançava com delicadeza, sendo conduzida com maestria por seu príncipe encantado, envolvidos mecanicamente pela melodia lenta da canção de uma vida de mentiras. Seus belos e ensaiados passos a faziam rodopiar no centro do salão quase fantasmagoricamente.
Nenhum dos dois sorria; não havia motivos para isso.
Tic-tac. O relógio anunciava a tão temida meia-noite, seu som grave ecoando pelo salão vazio.
Assim acaba-se a música, o vestido volta a ser trapo e seu tão desejado parceiro some numa núvem de névoa. Ela finalmente vê a verdade: está sozinha agora.
Sempre esteve.
Desabou no chão como uma boneca de pano, incapaz de se mover ou sequer gritar por ajuda, os anos que se acumularam finalmente cobrando seu preço por sua juventude prolongada, fazendo-a sucumbir a idade avançada.
Num piscar de olhos transformou-se em pó.
E a única coisa que sobrara fora seus valiosos sapatinhos de cristais, brilhando ameaçadoramente sobre o monte de terra recém-formado, esperando sua próxima vítima.
Não era um presente, era uma maldição.
Cinderela finalmente conheceu seu fim.