O quarto da miséria
Meiling Yukari
Tipo: Conto ou Crônica
Postado: 20/09/20 17:48
Editado: 20/09/20 17:49
Avaliação: Não avaliado
Tempo de Leitura: 5min a 7min
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Palavras: 885
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Não recomendado para menores de dezoito anos
Notas de Cabeçalho

Antes de mais nada, já aviso que o conteúdo é um tanto sórdido e um tanto perturbador.

Se todos fossem como o Jorge, ele não precisaria ter chego a esse extremo... Mas infelizmente o mundo está cheio de humanos podres.

Capítulo Único O quarto da miséria

“Eu juro que nunca mais...”, foi a última frase que Jorge disse naquela casa.

Jorge era um homem da elite, muito bondoso, durante sua vida ajudou muitas instituições de caridade, levava comida para mendigos, e sempre praticava boas ações para com os pobres.

Certa vez Jorge se apaixonou. Ela era uma moradora de rua, mas tão bonita que fazia o coração do homem pular de alegria. Infelizmente quando ele contou para sua família que havia conhecido o amor, quase foi deserdado, tamanha a repugnância que os pais dele sentiram ao ouvir a notícia.

Mas querendo evitar um escândalo na sociedade, o pai de Jorge acabou resolvendo as coisas do jeito mais fácil. Simplesmente mandou que matassem a moça por quem o filho havia se apaixonado.

Quando o coitado do homem descobriu que fim teve sua amada, ele virou uma poça de ódio, espumando raiva e rancor contra a alta sociedade da qual fazia parte. Mas manteve-se quieto e aguardou a oportunidade de agir.

Fingiu para seus pais que na verdade pouco havia ligado para a morte daquela indigente, e comprou uma enorme casa para ostentar seu dinheiro.

Com seus contatos importantes conseguiu arranjar uma visita de um político de outro estado do país. Mas depois do dia da visita, o tal político havia sido declarado desaparecido. E assim, pouco a pouco, Jorge foi juntando suas vítimas.

Começou por políticos, ricos, famosos, ricos, ricos, parentes, ricos, ricos, conhecidos da família, e por fim, mais ricos, e claro, mais ricos. Foi juntando devagarinho várias pessoas de alta classe em seu porão, que havia sido decorado como um belo quarto de hóspedes para receber suas odiadas visitas.

Ele escolheu muito bem cada um de seus ilustres convidados... todos com um histórico de nunca terem doado dinheiro para a caridade, e com certos hábitos de menosprezar pessoas pobres. Inclusive, fez uma limpa em um grupo neonazi que havia descoberto existir em sua cidade.

A entrada do porão ficava muito abaixo de uma longa escada, então Jorge podia ficar lá do alto observando suas cobaias humanas irem entrando em desespero dia após dia, semana após semana.

Ele dava comida apenas um dia sim, um dia não, para deixá-los famintos, mas não a ponto de morrerem, e uma vez por dia despejava água com uma mangueira, para se divertir ao ver aqueles malditos rastejando no chão para lamber a água do piso imundo.

Imundo porque ali não havia banheiro, e todos mijavam e cagavam no chão mesmo. O mesmo chão no qual era jogada a água e a comida, que geralmente consistia em pedaços de fruta envelhecida, carne crua, arroz velho, e muita sopa fervendo, para queimar suas vítimas.

Os primeiros a ficarem presos quase enlouqueceram, se recusaram a cagar e a comer. Mas logo tiveram que ceder ao desespero da fome e se alimentar daquelas podridões, que lhes causavam diarreia. Quanto mais pessoas chegavam, mais merda ficava acumulada no chão, e mais imunda ficava a situação.

Os últimos sortudos a entrarem nesse divertido quarto da miséria foram os próprios pais de Jorge, que quase morreram de desgosto, horror e nojo com tudo o que viram. Aquelas pessoas todas que viviam em berços de ouro, agora estavam ali vivendo no meio da bosta.

Haviam ao todo 23 pessoas presas ali, e a partir de determinado momento, começou a diversão real, pois Jorge cortou completamente o fornecimento de alimentos. Passados três dias, jogou cinco carcaças de gatos mortos e disse aos prisioneiros que aquela seria a refeição.

Muitos vomitaram, vários choraram, mas alguns desesperados foram para cima dos bichos mortos e começaram a devorá-los. Era o início da perdição. Passados mais três dias, mais gatos mortos foram jogados, e muito mais pessoas se alimentaram daquela carne pútrida.

Agora sim, era carnificina que Jorge queria ver. Ele queria ver destruição, aquele bando de hipócritas se destruindo feito loucos. E para tal feito, ele deu para seus prisioneiros dez facas afiadas, e ordenou-lhes que se matassem para poderem comer uns aos outros.

Todos ficaram assustados, pareciam não acreditar na insanidade daquela situação. Mas não foi necessário nem sequer esperar por quatro horas... que o pandemônio se iniciou.

A maioria estava com as roupas rasgadas, alguns já pelados completamente. Todos fediam podridão, e todos descalços tinham os dedos dos pés encrustados em bosta fétida. O chão era um verdadeiro aterro sanitário, no qual o lixo era composto de merda, mijo, vômito, ranho, baba, sangue, menstruação, e até mesmo sêmen, pois alguns homens haviam se masturbado ali. E claro, os próprios humanos eram o pior lixo que estava habitando aquele recinto.

Com as facas em mãos, aqueles humanos ensandecidos foram para cima um do outro, esfaquearam-se e morderam-se, querendo acabar um com a vida do outro, para ter o que comer. E Jorge se divertia, assistindo tudo isso de camarote.

Sua vingança estava feita, aqueles humanos podres estavam do modo que eles mais desprezavam: na mais pura miséria.

Jorge então faz um último aviso para seus odiados prisioneiros:

– Hoje mesmo vou me mudar desta casa, irei morar na Suíça. Mas não se preocupem, eu juro que nunca mais vocês serão encontrados, pelo menos não com vida, pois o isolamento acústico da casa nunca deixaria ninguém saber que vocês estiveram aqui. Podem se matar e se devorar a vontade. Nos vemos no inferno, seus filhos da puta.

❖❖❖
Notas de Rodapé

Agradeço muito pela leitura <3

Espero que em algum momento esse mundo possua mais humanos como o Jorge do início do texto, bondoso, caridoso...

Pois somente assim o Jorge vingativo do final nunca precisaria ter existido...

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Postado 25/09/20 13:00 Editado 25/09/20 13:01

Mei, meu anjo das trevas... Estou sinceramente impressionado com a intensidade da sua Doença nesta obra. Não que eu esperasse menos de uma das autoras de Terror/Horror mais talentosas, temerárias e absolutamente criativas deste antro maldito, longe de mim. Todavia, este conto com toda a certeza é um dos mais chocantes de todo o acervo da Academia da Carnificina. Ouso dizer que mesmo dentre os seletos membros desta pequena parcela do site, não são todos que conseguiram extrair todo o deleite que tal empreitada oferece.

Jorge era um tipo raro de humano: abastado, mas ainda assim empático e nobre. Contudo, podemos ver em primeira mão como a sociedade inumana onde vivemos (especialmente no topo da pirâmide) pode converter um homem em uma monstruosidade sádica e vingativa.

Aliás, eu não creio que a palavra vingança caiba em uma situação dessas. Houve uma justa retribuição, uma devolução e exteriorização da imundícia interna de cada cativo. A descrição e narrativa primorosas me arremeteram imediatamente aos mesmos sentimentos de repulsa, reflexão e contentamento que senti ao assistir filmes como 120 Dias de Sodoma, O Poço e até mesmo Código de Conduta. Sinplesmente maravilhoso.

Vale a pena ressaltar que toda essa atrocidade crescente e enojante não foi oriunda de um desejo psicopata ou um malevolente desejo do Mal pelo Mal, mas sim pelo abrupto e deliberado término de algo que poderia ser muito maior, bonito e precioso que a própria vida do "anfitrião". E isso tudo torna a obra tão medonha quanto trágica, o que em muito me apeteceu!

Mein engel, verdadedeiramente admiro sua disposição em inovar, chocar, ir além dos limites do comum/esperado neste gênero. E isso, minha inestimável Mei, é algo que me empolga e inspira tanto! Sou muito grato por compartilhar sem medo nem rodeios mais uma amostra de sua criatividade doentia e fascinante conosco!

Excelente trabalho, se superou lindamente, Mei(n) Engel! Bravo! Bravíssimo!

Atenciosamente,

Um ser perdido nas próprias merdas, mas feliz demais por mesmo assim ter a autora ao meu lado, Diablair.

Postado 26/09/20 18:11 Editado 26/09/20 18:12

Meu querido Diablair, fico tão imensamente feliz por sua ilustre presença aqui em meu texto!!

Ainda mais feliz você me deixa ao enaltecer a Doença aqui retratada!! Muitíssimo obrigada por apreciar tanto meu estilo de conto do horror humano!!

Obrigada por concordar comigo que a vingança é muito do que apenas uma vingança, é uma verdadeira justiça, feita com as próprias mãos...

Muito me alegra e me deixa lisonjeada a sua comparação de minha obra com esses citados filmes!! Minha Doença se recontorce e grita de alegria!!

Agradeço de todo meu coração por você ter gostado tanto disso aqui que eu escrevi, meu querido Diab <3

Obrigada por todos os elogios!! Você e sua Doença são minhas grandes inspirações!!

Um grande abraço, de uma criatura que não se importa em mergulhar em um mar de merda líquida, se esse fosse o preço para ficar ao seu lado <3

Meiling <3

Postado 20/09/20 21:23

Infelizmente mei, o mundo está cheio de falsos bondosos, hipócritas e flosofos de aluguel, que fazem sua etica em cima do dinheiro.

Postado 26/09/20 18:14

Infelizmente tenho que concordar com você... Pois o mundo é uma verdadeira perdição...

Falsos bondosos e extremos gananciosos estão em todos os lugares...

Muito obrigada, Sr. Urizen, por seu comentário!!

Um grande abraço <3

Postado 25/09/20 21:51

A leitura dessa obra é chocante. Fiquei presa nas palavras do começo ao fim. Além de ter ficado impressionada e aterrorizada, devo dizer que a narrativa é incrível e que você usou com maestria todos os meios diponíveis para escrever acerca dessa proposta. Estou sem palavras...

Obrigada por compartilhar essa obra conosco!

Parabéns, Mei ♥

Postado 26/09/20 18:25

Sinto-me imensamente realizada: eu, mera mortal, consegui chocar nossa Divindade Sabrina Tortura!!

Agradeço muito por sua presença e por seu comentário aqui, querida Brina <3

Muito obrigada por todos os elogios!! Grande abraço <3

Postado 01/10/20 22:30

Eu quase - quase mesmo - chamei um palavrão agora. Que texto forte, MeiLícia. Totalmente Doente. Não tenho nem palavras para descrever o que foi ler a obra.

Parabéns!!!!!

Postado 02/10/20 15:47

Senhorita Flávia, seu comentário em muito me alegra e deixa feliz!!

Senti-me completamente enaltecida por suas palavras!!

Muito obrigada por ter lido meu conto <3

Um grande abraço <3