Não se sabia ao certo quem — ou o que — poderia estar cometendo os crimes no Alto Capão da Serra. As vítimas eram encontradas sem uma gota de sangue, cada uma faltando um órgão vital diferente.
— Seria um serial killer, um maníaco, um desses adoradores do diabo? — perguntava-se o detetive Otávio, enquanto observava mais um corpo sem vida.
— Quem cometeria tais crimes perfeitos, detetive, sem deixar pontas soltas? — questionou Madureira, o velho delegado da região, com o rosto pálido de medo.
— Não faço ideia, delegado — respondeu Otávio, saindo apressadamente, como se fugisse de algo invisível.
Madureira tentou acompanhá-lo, mas logo o perdeu de vista. Estava escurecendo. O delegado já se encontrava a certa distância da pequena vila quando ouviu passos atrás de si. A lua cheia iluminava o caminho com uma luz pálida e fria.
Foi então que a criatura apareceu. Demoníaca, com garras longas e afiadas, dentes pontiagudos e olhos afundados, vermelhos e brilhantes. Num átimo de segundo, agarrou Madureira pelo pescoço e passou a língua em seus olhos, sugando-os junto com todo o seu sangue. O homem não teve tempo de reagir. Seu corpo foi deixado no chão como um boneco de carne e ossos.
Na manhã seguinte, o detetive Otávio encontrou o corpo do delegado. Estava sem reação, indignado e perturbado. Enquanto examinava a cena, um jovem apareceu do nada.
— Os senhores já ouviram falar do Wendigo? — disse o rapaz. — Uma criatura que, durante um inverno rigoroso, matou a fome com a única coisa que tinha para comer: carne humana. Era um homem canibal que se transformou em um demônio. Desde então, passou a sugar sangue e devorar órgãos humanos para se regenerar.
— Quem diabos é o senhor? Nunca ouvi falar nesse tal de demônio comedor de carne — retrucou Otávio, furioso.
— Ah, permita-me apresentar. Sou Daniel, professor da escola aqui da região e historiador — disse o jovem, com um sorriso enigmático.
— Pois bem, meu jovem, não tenho tempo para crendices ou contos de terror — respondeu o detetive, saindo apressado, cabisbaixo e pensativo sobre a história do demônio devorador de gente.
Naquela noite, a escola ficou em silêncio. Daniel, o professor, permaneceu sozinho na sala de história, escrevendo em um caderno antigo. Às oito da noite, os gritos começaram.
Alunos foram encontrados com os olhos arrancados, corpos secos como folhas de outono. O chão da escola estava coberto de sangue e órgãos espalhados. Otávio correu até lá, mas já era tarde.
No centro da sala, entre os corpos, estava Daniel — ou o que restava dele. Sua pele havia se rasgado, revelando uma criatura esquelética, com garras e dentes monstruosos. Seus olhos vermelhos brilhavam como brasas.
— Eu avisei, detetive... o Wendigo não é uma lenda. Ele vive. E agora... está com fome.
Otávio tentou sacar sua arma, mas o Wendigo avançou com velocidade sobrenatural. O último som ouvido naquela noite foi o estalo de ossos sendo quebrados e uma risada que ecoou pela serra como um aviso sombrio.