Um moço andava aos tropeços, suas roupas estavam rasgadas e seu corpo ferido sangrava. Mikael tentava atravessar uma estrada, esforçando-se ao máximo para dar um passo de cada vez.
Ele havia conseguido fugir do cativeiro onde estava sendo mantido preso e violentado por meses a fio. Três homens de meia idade eram seus raptores, mas por um descuido deles, o jovem de 20 anos conseguira fugir.
Já estava anoitecendo, o pobre moço estava exausto, nunca conseguiria chegar até a próxima cidade... A pista estava deserta, nenhum carro passava por ali.
Mikael lembrou-se de sua família querida, de seu namorado amoroso, e sentiu muitas saudades, começando a chorar. Em meio ao pranto, lembrou-se de suas aulas preferidas na faculdade... Filosofia: Schopenhauer.
– O homem vive abandonado a si mesmo, incerto de tudo, imerso na indigência e no anseio – sussurra o jovem homem olhando assombrado para a lua.
– As mais das vezes, a vida nada mais é do que luta contínua pela existência, com a certeza da derrota final – sussurra Mikael enquanto coloca as mãos no rosto e cai de joelhos no meio da pista.
Ainda de joelhos, o moço se curva em um pranto profundo e vai abaixando sua cabeça até o asfalto, derramando suas tristes lágrimas sobre ele.
– A vida é mar semeado de escolhos e sorvedouros. E até aquele que consegue sobreviver nada mais faz do que aproximar-se pouco a pouco do grande, fatal, inevitável e irremediável naufrágio, rumo à morte, último passo da penosa viagem – grita o homem, raspando seus lábios já feridos e ensanguentados no áspero asfalto.
Mikael deita-se em posição fetal, chorando convulsivamente.
– O homem é um animal selvagem e feroz, é o único animal que faz sofrer os outros pelo único objetivo de fazer sofrer, pois o homem se compraz no mal alheio – fala o moço em meio aos soluços de seu choro descontrolado.
Ele então começa a se lembrar de tudo que viveu no cativeiro, do modo como aqueles homens asquerosos o haviam estuprado e espancado. Seu corpo todo dói ao se lembrar de tantas violências. Ele sente como se sua alma tivesse se partido.
– A realidade é que o mundo e os homens são, por um lado, as almas danadas e, por outro lado, os próprios demônios – urra Mikael em estado de profunda dor e horror.
– A infelicidade é a norma. A dor e a tragédia são a essência da vida dos indivíduos, e também a essência da história de toda a humanidade...
O jovenzinho mal tem tempo de terminar sua última frase quando é interrompido pelos sequestradores que chegam de carro. Um deles desce do automóvel e, gargalhando da filosofia que o menino estava falando, atira nele a queima-roupa.
– O maior delito do homem foi o de ter nascido... – pensa Mikael enquanto fica inconsciente com os tiros, sucumbindo à morte.