Geração Ghost
Vanessa Souto
Tipo: Conto ou Crônica
Postado: 29/05/18 23:45
Editado: 11/06/18 20:57
Avaliação: 10
Tempo de Leitura: 4min a 6min
Apreciadores: 6
Comentários: 4
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Palavras: 744
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Livre para todos os públicos
Capítulo Único Geração Ghost

Anabelle era uma jovem divertida, gostava de sair com as amigas nos finais de semanas pelos barzinhos ou shows da cidade assim como também era viciada em series de tv.

Pedro adorava ler HQs, passava metade dos seus dias jogando ou andando de skate na pista improvisada que havia numa praça próxima a sua casa e claro não dispensava uma cerveja.

Anabelle e Pedro se encontraram numa noite de sexta feira num dos parques da cidade onde acontecia um show de uma banda cover de Red hot chili peppers.

Ela de longe avistou alguém que lhe chamou a atenção, o garoto bronzeado de cabelos cacheados que sorria esbanjando uma alegria contagiante que ela podia jurar que literalmente o iluminava ou talvez fosse apenas o efeito do álcool, todavia já estava decidida então ao som de ’Dark necessities’ Anabelle caminhou em direção a Pedro sob o efeito de vários coquetéis de bebidas alcoólicas aleatórias e lhe pediu um beijo.

Pedro já um pouco entorpecido pelas as diversas cervejas que tomou observou a garota de cabelos lisos e ruivos escorrendo até a cintura, as bochechas rosadas e os olhos na cor âmbar brilhantes, desceu um pouco os olhos e viu as curvas avantajadas da garota através da calça skinny e da blusa com um decote que poderia ser discreto se não estivesse no corpo dela e pensou ‘como posso dizer não pra isso?’

Então respondeu um ‘claro’ meio desnorteado quando a garota se aproximou e o beijou, beijo esse que se tornou tão profundo e envolvente que os fez se esquecerem que estavam em um local publico, então enquanto Anabelle se admirava com o tempo que eles conseguiam manter o beijo sem fazer pausas para respirar, o negocio ficou tão ‘quente’ que muitos pararam para olhar e as amigas da garota até filmaram o acontecido enquanto os amigos dele apenas gritavam em comemoração do ato e riam.

Os dias se passaram, Pedro e Anabelle passaram a se encontrar semanalmente ela como forma de matar de tédio e a solidão que sentia e ele apenas por se divertir com a ‘companhia’ da garota, ele a levou a casa dele para um churrasco descontraído onde a mãe dele acabou conhecendo a garota e a enchendo de elogios, a garota confiante logo foi reduzida a uma tímida adolescente diante do acontecimento.

Eventualmente a garota se pegava sentindo a falta dele como nunca sentira antes e foi quando se deu conta que não era mais apenas sobre o tédio e a solidão.

Claro que havia algumas discussões, mas sempre acabavam com Pedro constatando o quanto gostava dela, em uma dessas discussões até foi dito um eu te amo que fez a garota se derreter.

Tudo ia bem até que um dia Anabelle percebeu que os beijos já não eram envolventes, percebeu que as conversas mais pareciam um monologo dela e sem os beijos e seus monólogos podiam ser ouvidos os grilos ao redor deles, foi quando ela percebeu que o ‘lance’ tinha acabado e então em um ultimo encontro estranho no qual os dois quase não disseram nada, não houve beijos nem ao menos no rosto para se despedirem, Pedro não disse um ‘não é você sou eu’ Anabelle também não disse nem ao menos ‘é acabou, mas podemos ser amigos?’ os dois apenas fingiram que nada aconteceu e que tudo estava ocorrendo de maneira usual, desse modo cada um seguiu seu caminho.

Ela até esperou que ele aparecesse nas redes sociais para puxar algum assunto como fazia nas madrugadas ou tardes tediosas, até esperou o típico “hey, sumida”, porém nada aconteceu.

Duas semanas depois Pedro estava namorando com Bianca, Anabelle e Pedro nunca mais voltaram a se falar...

Vós apresento assim a geração ‘Ghost’, a geração que rompe relacionamentos amorosos e amizades sem dar explicações, a geração onde o termo ‘ghosting’ está cada vez mais popular e ouvimos testemunhos como:

“Ele disse que ia à vendinha na esquina comprar um maço de cigarros e estou esperando até hoje, uma semana depois...”

“Ele parou de me responder algumas horas antes do encontro e nunca mais apareceu, foi um ghosting e um bolo!”

Testemunhos esses que não nos causam espanto, pois caíram na rotina, se tornou tão comum e banal quanto um ‘ bom dia’, tão banal quanto um ‘eu te amo’ que hoje em dia também perdeu seu valor...

Bem vindo a era da geração Ghost e vá se acostumado ao termo ghosting, talvez você ainda ouça muito por aí!

❖❖❖
Notas de Rodapé

O termo ghosting não foi algo da minha autoria, me deparei com ele lendo uma postagem em um blog do qual não me recordo o nome agora, esse conto é apenas uma versão argumentada da minha autoria com base no termo em questão. Achei que esse fato merecia ser esclarecido.

Espero que tenham gostado ❤

Apreciadores (6)
Comentários (4)
Postado 10/06/18 14:51

Nunca foi tão bem descrito os relacionamentos atuais até o nascimento dessa obra. Sinceramente, essa obra só confirmou o que penso a respeito dessa nova autora: um talento diferente e incrível que consegue descrever as peripécias diárias de forma estupenda (quase uma modernista, ein, rs).

A maneira que a narrativa se desenvolve, me fez entrar de cabeça dentro das cenas descritas. O início do "relacionamento" cheio de flores e amores e, logo em seguida, o fim sem despedida e com um grande descaso, é o reflexo perfeito do que temos atualmente.

A Geração Ghost, infelizmente, predomina com fervor em tempos de mais paixão e zero amor.

Obrigada por compartilhar tal obra. Meus parabéns <3

Postado 10/06/18 22:32

Satã, que venha logo a Geração Deceased ou mesmo Buried o quanto antes!

Acredito que o comentário da Srta Ternura é totalmente acertado e condiz em gênero, número e grau com a minha visão das coisas. Claro que uma coisa feito eu falar sobre interações sociais e/ou afetivas soa mais como um gracejo ou mesmo um insulto hipócrita, mas a verdade é que a falta de empatia das pessoas atualmente gera esse tipo de mazela, tão brilhantemente narrado e descrito nesta obra.

No fim, o tédio e a solidão é o que predomina/resta para a Geração Ghost, que tal qual sua alcunha, tem suas emoções e vivências convertidas em algo efêmero, fugaz e intangível no que resta de seus corações atrofiados pela falta de uso real.

Perdão pela reflexão incoerente e inútil. E parabéns por (mais) uma obra de qualidade e criatividade que solapa a verdade em nossas caras!

Atenciosamente,

Um ser da Geração Old Satanic School, Diablair

Postado 19/06/18 10:59

A vida acontece muito rápido, em um minuto podem acontecer coisas que nos deixem acordados durante um mês todo... Nós interferimos na vida uns dos outros por apenas existir, e agora sabemos coisas que antes não sabíamos e de repente tudo se acaba, o ciclo se encerra ali, uns aprenderam algo de imediato, outros só se darão conta mais tarde, a vida está cheia disso...

Talvez eu esteja muito acostumada a ser um fantasma, eu sempre amo profundamente e me dou inteiramente a tudo que me aparece, a toda a pessoa que me desperta felicidade, mas surge um tempo, que eu já sei que não sou mais necessária, vou vivendo os dias e a sensação simplesmente se concretiza, até que eu apenas desapreço, e lhe digo, quando eu desapareci para a maioria das pessoas, elas nem deram falta.

A vida está cheia de ciclos, de alguns, nós choramos e nós despedimos, de outros, a gente simplesmente reinicia, acorda com o sol num dia aleatório e pronto, somos novos. Fazemos novas coisas e vamos a novos lugares.

Seu conto é extremamente precioso, obrigada pela reflexão!

Postado 16/02/21 17:58

Gostei bastante do seu texto, foi muito esclarecedor.

Já havia ouvido o termo mas nunca uma explicação de como é no dia a dia.

Obrigada por compartilhar conosco!

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