Roxo
Soraia
Tipo: Conto ou Crônica
Postado: 25/10/16 15:21
Avaliação: Não avaliado
Tempo de Leitura: 4min a 5min
Apreciadores: 8
Comentários: 5
Total de Visualizações: 1027
Usuários que Visualizaram: 12
Palavras: 665
[Texto Divulgado] ""
Não recomendado para menores de doze anos
Notas de Cabeçalho

N/A: Yo!! Olá a todos e obrigado por terem clicado no meu segundo conto. Espero que gostem e não se esqueçam de dar uma opinião no final. o/

Advertências: Texto participante do desafio quinzenal 16 – Transmutação. Drama/Angst. One-shot.

Disclaimer: As personagens aqui presentes e mencionadas pertencem-me. Qualquer reprodução delas sem a minha autorização é plágio.

Capítulo Único Roxo

Roxo

-x-

A jovem encarava o espelho.

Em todos os seus dezasseis anos de vida nunca julgou que pudesse odiar tanto o reflexo que a fitava de volta.

Os cabelos castanhos-escuros, quase pretos, lisos e finos, a cara pálida, amarelada, típica da sua descendência, e os olhos castanhos, normais e aborrecidos.

Horrível.

Aquela aparência comum e enfadonha que toda a gente, sem excepção, naquele maldito país envergava, era horrível. E ela odiava-a.

Por que aquele aspecto maldito era o culpado de tudo o que estava a sentir. Aquele espectro de cores neutras e vulgares tinha feito um rasgo no seu coração. Por que ele era diferente.

O rapaz que tinha aparecido no telhado da escola, a meio da hora de almoço, ofegante e sorridente, era diferente.

Quando ela se aproximou para perguntar se estava tudo bem não esperava ser encarada por olhos grandes, quase sem qualquer traço oriental, e azuis. De um azul tão escuro como o céu ao anoitecer.

Ela não esperava que nos próximos dias passasse a procura-lo com o olhar pelos corredores, nem que fosse sentir o rosto corar quando o via sorrir de volta e acenar-lhe com tanto fervor.

Não esperava que ele fosse tão aberto. Ele falava pelos cotovelos e contava-lhe sobre todos os seus sonhos e planos para o futuro. E ela ouviu-o, permitindo-se também sonhar um pouco naquela esperança emprestada.

Uma esperança que foi esmagada assim que ouviu as risadas irónicas das colegas. Assim que notou certos olhares que lançavam a ele e assim que ouviu o que lhe chamavam pelas costas.

Estrangeiro.

Seria ele mesmo estrangeiro? Era essa a razão daqueles olhos estranhos e brilhantes? Ela quis perguntar-lhe… Ela perguntou-lhe.

E, com aquele sorriso gigante e tonto, a resposta doeu-lhe.

— Não sei.

Não importava se ele o era ou não. Para ela, não importava. Mas para aquele mundo que os rodeava parecia importar.

Não interessava o quanto ele era inteligente, o quanto ele se esforçava, o quanto ele era simpático e carinhoso. Não, nada disso interessava. A cor dos olhos… a cor dos olhos é que interessava.

Olhos azuis.

Olhos que foram vistos pelo seu pai, naquela tarde, em que ele tinha sugerido levá-la até a casa.

Com genuína preocupação e carinho, ele tinha-se oferecido para caminhar com ela no percurso de volta, partilhando aquelas ideias sonhadoras e fantasiosas com ela, conseguindo fazê-la acreditar num futuro quase feliz.

E o seu pai aguardava-a. E o seu pai viu-o. E o seu pai… odiou-o.

Agarrou-a pelo braço para longe dele e empurrou-o, como se de lixo se tratasse. Cuspiu palavras nojentas e repugnantes, insultou-o, ameaçou-o e quase o agrediu se não fosse por ela o ter segurado a tempo.

Ela viu aquele rapaz magricela e simpático erguer-se, viu-o curvar-se de forma respeitosa perante aquele homem horrível, a quem ela um dia tinha chamado de pai, e viu-o desculpar-se pela sua rudeza e petulância. Prometendo nunca mais aproximar-se dela, sem sequer olhar para ela, ele foi-se embora.

Ela sentiu o coração afundar-se no seu peito. Sentiu-o partir-se em mil e um pedacinhos e sentiu aquela vaga esperança fugir-lhe da alma.

Gritou com o pai, disse-lhe que estava errado, que aquilo não fazia qualquer sentido. Mas o que não fez mais sentido foi a bofetada que ela sentiu atravessando-lhe a bochecha.

Trancada no seu quarto e proibida de sair para qualquer sítio, excepto para a escola, ela percebeu que o mundo era injusto. Percebeu que o mundo não sabia aceitar o que era diferente, não queria. E ela percebeu o quanto era horrível.

Mas ela também percebeu algo mais.

Ela não precisava que o mundo mudasse. Bastava ela mudar.

E foi com isso em mente que ela despejou todo o conteúdo do frasco nos cabelos castanhos-escuros e o roxo vivo apoderou-se deles.

Com um sorriso no rosto, ao encarar a sua nova figura, ela soube que nem queria que o mundo mudasse mesmo. Ela só queria poder estar junto daquele rapaz sorridente de olhos azuis meia-noite. Para sempre.

-x-

Fim

❖❖❖
Notas de Rodapé

N/A: E terminou! Antes que me atirem pedras, esta história passa-se no início da década de 80, no Japão. O Japão é sim um país maravilhoso, eu adoro-o, e hoje em dia este tipo de coisa não se vê. Espero eu. Mas foi uma realidade do passado. Quem sabe, não tão extrema, mas isto é ficção. ;)

Aviso apenas que, apesar de não ter colocado os nomes das personagens, elas têm nome. Não pus, pois as personagens fazem parte da minha história, “Em Busca de um Anjo”, embora não seja necessário ler essa para apreciar este pequeno conto/one-shot.

Quero agradecer a quem leu até aqui e, se quiserem, deixem a vossa opinião nos comentários. Obrigado a todos! :*

Apreciadores (8)
Comentários (5)
Postado 25/10/16 15:31

Depois de ler esse conto, vou ler sua história com maior atenção, porque garota, que texto maravilhoso. Você retratou a curiosidade inocente, um encontro tão natural entre duas pessoas de origens distintas que se transformou em amizade e parecia tão certo, tão normal, mas a tradição de repugnar o que é diferente, infelizmente, ainda se faz presente.

Por isso dizem que crianças são insentas de preconceitos, a menina da estória não via problema algum em se relacionar com alguém bem diferente dela, na aprência somente, pois ambos pareciam boas pessoas. O garoto também, imagino que ele se sinta deslocado por ser diferente, mas as diferenças são algo bom, elas atraem pessoas. O mundo é grande demais para seguir um padrão, e estúpidos são aqueles que discordam e desejam uniformizar todo o globo.

Agora, menos séria: adorei a escolha de cabelo roxo, shuahsua. Imagino que deva ter combinado bastante com ela, embora, ela não devia ter descolorido o cabelo antes de pintar? Não acho que dá certo colocar uma cor em cima do preto, mas enfim.

Foi lindo de se ler, moça, parabéns <3 <3

Postado 25/10/16 16:02

Olá!

Muito obrigado pelo comentário maravilhoso! :D Fico super feliz que o encontro deles tenha ficado natural e que todo o desenrolar da amizade/amor também. Eu tento. :v

Concordo plenamente na beleza da diferença, faz todo o sentido. Mas o mundo é sim injusto e, apesar de estarmos já em 2016, ainda se vêem coisas bem estranhas e idiotas por aí. :/ E quanto ao rapaz, não quis focar em nada dele porque, no fundo, seria spoiler da história a que este conto está ligado, mas posso afirmar que ele aprendeu a viver com isso de uma forma... boa. :D

Quanto à moça, o cabelo dela ganha outra cor no futuro, mas primeiro foi o roxo. o/ Quanto à cor pegar, foi pintado em cima do cabelo natural, então pegaria sim, afirmaram-me isso de fonte segura. :D E ela estava em 81... não acho que ia ligar muito a esses detalhes. xD

Sério, muito obrigado pelo comentário, fiquei bem feliz por teres gostado!

Inteh! o/

Postado 25/10/16 15:48

E aí, beleza?

Bem, como eu sou macaca velha vou falando!

A Miya nova linda! Quero dar um morro no pai dela!

Mas voltando a história, adorei conhecer esse pedaço da vida dela. Sim, eu também fiz uma pesquisa sobre o Japão nas décadas de 60, 70 e 80, era mais rigoroso sim. A aceitação com estrangeiros era muito rara. Hoje o Japão incentiva a adoção e aceitação, já que os "puros" estão acabando.

Imagino o que ela não deve ter passado nas mãos de família desse naipe! Ainda mais quando desafiou o bom costume de não seguir o padrão imposto naquela época! Quero mais histórias dela e do Tsushilindo <3

Claro que também quero EBDUA!

Mas é isso, está linda demais! Viva aos cabelos roxo!

Beijos e até mais! <3

Postado 25/10/16 16:06

Oiiii! :D

Bah, muito obrigado pelo comentário lindo! Hoje e ontem, já que leste o rascunho disto aqui.

Eu lembrei-me da tua pesquisa sobre o Carter lindo para escrever este pedacinho. :D E até porque o Tsushilindo nem é estrangeiro, ahahaha. Mas parece. :v

Não posso contar nada da família dela, até porque seria spoiler de EBDUA 2!!! :D

Também quero escrever mais com eles dos dois, vamos ver. <3 E domingo está a chegar para mais EBDUA! o/

Viva sim aos cabelos roxos! <3

Beijos! o/

Postado 25/11/16 22:01

Que liiiiiiiiiiiiiiiiindo *u*

Postado 25/11/16 22:24

Obrigada!! :D <3

Postado 01/07/17 18:10

Que amável. Os personagens me pareceram tão vivos, sinceramente adorei.

Obrigado pela reflexão e pelo belo texto.

<3

Postado 29/12/17 15:46

Ótima reflexão presente na obra. Meus parabéns ❤

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